O GLOBO - 10/12
Aos 68 anos, Lula constrói outra candidatura improvável, prepara o discurso e a campanha. Nas últimas eleições, elegeu seus ‘postes’ mais desdenhados pelos adversários
O desafio: eleger um candidato desconhecido até mesmo no próprio partido, numa região distante oito mil quilômetros de sua base eleitoral, onde os adversários detêm o poder e conservam a hegemonia política há três décadas .
O ex-presidente Lula tenta convencer seu PT a superar o ceticismo e ir à luta pelo governo de São Paulo carregando um candidato com “jeitão de médico do interior e falinha mansa”, como define. Ele atropelou todos os aspirantes para ungir Alexandre Padilha, de 42 anos, um paraense de Santarém que nunca disputou um mandato, cresceu na sombra da burocracia partidária e hoje é ministro da Saúde.
Sexta-feira passada, Lula apresentou Padilha a uma plateia de vereadores em Itupeva (SP). Ele era apenas um garoto de dez anos quando o PT começou a construir a máquina eleitoral que nas duas últimas eleições garantiu-lhe 12 anos na Presidência da República, maioria no Congresso, 665 cadeiras nas Câmaras e 73 prefeituras em São Paulo, inclusive a capital.
Lula tentava estimular candidato e audiência:
— Quem viu a morte passar perto e ficou com medo até de não poder falar, não tem por que ficar regateando. Perdemos as eleições aqui, várias vezes, porque nos faltaram 20% dos votos. E esses 20% não estão na esquerda. Se estivessem, era fácil. Poderia propor, Padilha, fazer uma aliança com o PSTU e o PSOL...
A plateia irrompeu em gargalhadas.
— Mas não está lá, não — prosseguiu. — Está numa parte difusa ideologicamente da nossa sociedade que foi impregnada pelo preconceito... E nós temos que quebrar isso. Temos de tentar colocar uma cunha no meio da base deles, porque não é possível fazer campanha com todo mundo contra nós. E tem sido sempre assim.
— Qual é o sonho de consumo político do petista? —provocou. — É ter uma chapa só do PT, sem coligação e a gente ganhar. Outro sonho de consumo seria fazer uma aliança só pela esquerda mas, além do PT, tá difícil saber quem é esquerda... Vamos procurar outros parceiros, e você tem que ter a habilidade de construir essa aliança que nos dê a base para competir.
Lula lembrou que não será suficiente dividir adversários, aliando-se à centro-direita:
— Precisamos fazer um programa que seja como factível, e não pareça ficção ou peça eleitoral. E vamos comparar tudo. Aquele negócio que fiz, na eleição da Dilma, de comparar 2002 a 2010, aquilo matava, porque não era eu falando, eram estatísticas.
Voltou-se para o candidato: — Então, Padilha, vai se entender com a nossa presidente, porque nos primeiros três meses você vai ter de estudar o estado, seus problemas e as soluções... Eu acho que você é o cara. Vou me dedicar, me dividir um pouco com você e a Dilma, até porque acho que a Dilma está numa situação mais confortável, mas também não é fácil. Agora, com cara boa, viu Padilha. Vai dar zebra, como dizia a música que o (Marcelo) Déda cantava:
Esse ano vai dar zebra
Com certeza vai dar
O povo trabalhador
Já cansou de esperar
Aos 68 anos, Lula está à caça de votos. Goste-se ou não, nas duas últimas rodadas eleitorais ele construiu candidatos, preparou-lhes o discurso e as táticas de campanha. E, no final, elegeu seus “postes” mais desdenhados pelos adversários.
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