O GLOBO - 11/09
Três meses depois de o Brasil ir às ruas reivindicando ações contra a corrupção e melhores condições de saúde e educação, já dá para avaliar o que o Black Bloc provocou no movimento popular: ele exterminou as manifestações espontâneas que pareciam sinalizar para um novo país. Durante um pequeno período tempo, ainda era possível dizer que parte das manifestações eram pacíficas. Hoje, não. A classe média se afastou das ruas e só sobrou a violência. Ou os Black Blocs.
Como tudo que cerca este movimento... bem, eles não se consideram um movimento, embora ajam da mesma maneira em todo o mundo e com os mesmo objetivos. Como se fossem técnicos de futebol, eles se dizem uma tática, seja lá o que isso possa significar. Tanto na boca de Black Blocs quanto na de técnicos de futebol. Então, corrigindo, como tudo que cerca esta tática e seus coirmãos — a ONG Fora do Eixo (será mesmo uma ONG?) e o grupo de videomakers Midia Ninja — não há nada de novo nesta atitude. Um adendo: há quem diga que os Mídia Ninjas são a primeira demonstração de democratização da notícia. Isso dá até preguiça. Alguém acredita mesmo que, com a internet no ar há mais de 20 anos, a transmissão de um evento ao vivo pode ser considerada uma novidade? Há sempre o contra-argumento da imparcialidade, da transmissão sem interesses, diferentemente da mídia tradicional. Mas, vem cá, alguém acredita mesmo que a Midia Ninja é imparcial nas suas coberturas? Que ao
transmitir o confronto entre manifestantes e policiais ela não o faz demonstrando para que lado está torcendo?
Mas o assunto aqui é Black Bloc e, mesmo que o movimento, ou melhor, a tática se confunda com a da Midia Ninja — pelo que entendi, pela coluna de Caetano Veloso do domingo passado, os dois grupos frequentam o mesmo apartamento na Zona Sul —, fiquemos nos pseudorrevolucionários de preto. Nos Estados Unidos, os Black Blocs também acabaram com o movimento Occupy Wall Street. Não há dúvidas das semelhanças entre o Occupy e a ida às ruas de três meses atrás. Um e outro gabavam-se de não ter líderes. Um e outro diziam-se espontâneos. Um e outro não aceitavam comandos partidários. Um e outro não tinham um objetivo claro. Um e outro receberam a simpatia da população. Um e outro foram inchados pelos mascarados vestidos de preto. Um e outro acabaram.
No começo do ano passado, quando o Occupy Wall Street já dava mostras de fraqueza, os ativistas que participaram dele definiam a participação do do Black Bloc no agito. "Os anarquistas do Black Bloc são o câncer do movimento Occupy", escreveu o jornalista Chris Edge em sua coluna no website "TruthDig". Hedges ganhou o Pulitzer em 2002 como um dos integrantes da equipe do "New York Times" que produziu uma série de reportagens sobre o terrorismo global. Por suas declarações públicas contra a invasão do Iraque, recebeu uma reprimenda do jornal e acabou pedindo demissão. No fim de 2011, ele estava entre os participantes do Occupy que foram detidos pela polícia nova-iorquina. "Eles (os black blocs)
confundem atos de vandalismo com revolução", acrescentou. Ativista do meio ambiente que estava entre os manifestantes do Occupy Oakland em novembro de 2011, Derrick Jenssen afirma que "o Black Bloc pode dizer que está atacando policiais, mas, na verdade, ele está destruindo o movimento Occupy".
Integrantes do Black Bloc dizem que estão nas passeatas para defender os manifestantes contra a polícia. Como a polícia é agressiva e armada, e os manifestantes são ingênuos e desarmados, estão lá para protegê-los. Nas manifestações do 7 de Setembro, eles "protegiam" exatamente quem, já que nas ruas só havia Black Blocs ou derivados?
Até essa definição de força de segurança de manifestações dá preguiça. Nos anos 60 do
século passado, esta também era a justificava, nos Estados Unidos, dos Black Panthers, os Panteras Negras. Na verdade, o nome original do grupo era Partido Pantera Negra para Autodefesa. A ideia era "patrulhar guetos negros para proteger os residentes dos atos de brutalidade da polícia". Como acontece aqui agora, os Black Panthers também tiveram o apoio de celebridades da época, o que rendeu uma obra-prima do new journalism assinada por Tom
Wolfe, "Radical Chic".
Ninguém duvida de que há exageros da polícia. E nem precisa acompanhar o Mídia Ninja para constatar isso. Basta ver o "Jornal Nacional" mesmo. Como há mais brasileiros com acesso à TV (93,7% dos lares do país têm um aparelho) do que com acesso à internet (30,7%), o "Jornal Nacional" é muito mais democrático do que a Mídia Ninja. Mas há algo intrigante na ação policial. Por que, nos recentes encontros dos professores, dos quais o Black Bloc não tomou
parte, não houve violência policial? Por que na última passeata contra a homofobia, na qual o Black Bloc não compareceu, não houve reação da polícia?
De qualquer forma, é tudo muito velho. No Brasil, com mais de 30 anos de atraso, ganhamos nossas Panteras Negras e nossos Radicais Chics. Historicamente, eles estão condenados à extinção. Mas até lá vão provocar muitos estragos. Como os dinossauros.
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