O GLOBO - 17/09
Neste mês de setembro, Jesse Owens completaria 100 anos. Owens gravou seu nome na história do esporte ao ganhar quatro medalhas de ouro nas Olimpíadas de Berlim de 1936. Sua conquista transcendeu o mundo desportivo e invadiu o campo da política internacional pelo simbolismo da glória alcançada em plena Alemanha nazista. Com a possível exceção da revanche de Joe Louis contra Max Schmeling, em 1938, nenhum evento esportivo capturou a imaginação do negro americano como as Olimpíadas de Berlim.
Nascido no Alabama, James Cleveland Owens era um dos onze filhos de pobres agricultores sulistas. Aos nove anos, mudou-se com a família para Cleveland, Ohio, como parte da migração em massa de cerca de 1,5 milhão de negros para o norte, em busca de oportunidades negadas pelo regime de segregação racial. Owens teve seu talento reconhecido nacionalmente no Campeonato Americano de Escolas Secundárias de 1933, quando igualou o recorde mundial de 100 jardas (91 metros) com a marca de 9,4 segundos, e o recorde de salto em distância com 7,56 metros.
Naquele mesmo ano, ingressou na Universidade Estadual de Ohio. Foi impedido de residir nos dormitórios localizados no campus, assim como de frequentar o restaurante universitário. Em 1935, durante uma das mais importantes competições universitárias dos EUA (Big Ten Conference), quebraria três recordes mundiais e igualaria um quarto.
Em Berlim, ganharia medalhas de ouro em quatro provas. Nos 100 metros, estabeleceu um novo recorde mundial, com a marca de 10,3 segundos. Muitos jornais americanos exaltaram o feito de Owens como uma vitória sobre o mito nazista da supremacia ariana. Não deixava de ser uma hipocrisia o fato de um atleta negro ser considerado herói em Berlim e tratado como cidadão de segunda classe em seu país. Como disse Owens, "ao voltar para casa, continuei me sentando no banco de trás do ônibus e sequer fui convidado à Casa Branca para apertar a mão do Presidente Roosevelt".
Jesse Owens nunca escondeu o fato de haver recebido tratamento honroso por parte do público e das autoridades desportivas alemãs. O tratamento dispensado a Owens por parte das autoridades políticas nazistas não foi tão afetuoso. Hitler teria se recusado a apertar sua mão após suas vitórias. Na verdade, o Cerimonial do Comitê Olímpico Internacional havia deixado claro às autoridades alemãs que Hitler não poderia ser seletivo: ou cumprimentaria todos os vencedores de provas ou nenhum deles.
Do ponto de vista desportivo, a Alemanha foi a vitoriosa das Olimpíadas de Berlim, terminando a competição bem à frente dos Estados Unidos, da Hungria e da Itália. Pelo prisma político, o grande vitorioso foi Owens. Seria um erro minimizar o efeito provocado por suas vitórias sobre o imaginário coletivo nos Estados Unidos e em outras partes do mundo. Morto em 1980, Jesse Owens, o maior nome do atletismo da primeira metade do século XX, deixou como legado ao esporte a lição de que o talento individual é mais valioso do que qualquer ideologia política e privilégios de nascimento, origem social ou racial.
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