Temos visto nos dias recentes diversas explicitações do desencontro que afeta a base aliada do governo, inevitável quando se tem uma coligação tão ampla quanto desigual, que abriga nada menos que 14 partidos aliados tão díspares quanto PT, PMDB, PSB, PCdoB, PDT, PP, PR, PTB, PRB, PHS, PTC, PTdoB, PMN e PSC. A ofensiva do PT contra o pastor Marco Feliciano, que assumiu a Comissão de Direitos Humanos na Câmara por acordo com o próprio PT e demais partidos da base governista, em troca de o seu partido, o PSC, ter dado apoio à presidente Dilma na eleição de 2010, é apenas o exemplo mais escandaloso de aonde podem levar essas "alianças de resultado".
Na disputa eleitoral, há quem faça o diabo para se eleger, como bem lembrou Dilma recentemente. Mas depois tem que coabitar com figuras como a do pastor, que também lida com o diabo ao falar de seus adversários. Mas é sintoma da doença grave que atinge o Congresso como um todo a tentativa de tirar o pastor de um cargo que jamais deveria ter ocupado por dizer que seus antecessores da comissão eram dominados por satanás. Sentir-se ofendido por tal afirmação, feita num púlpito de igreja, é levar a sério o deputado e pastor, quando deveriam levar mais a sério seus acordos políticos e as alianças partidárias.
A mesma falta de sintonia vê-se cada vez mais na relação entre o PSB do governador Eduardo Campos e o Planalto. Os dois lados tentam se tolerar dentro da mesma coligação partidária, à medida que vão se afastando devido aos interesses específicos de cada um em relação a 2014. Estão hoje tão longe um do outro quanto ficaram na enorme mesa principal da reunião da Sudene, onde duelaram verbalmente de maneira às vezes nada elegante.
Relatos dão conta de que enquanto o governador pernambucano discursava, com reivindicações e não agradecimentos, a presidente Dilma virou-se quase de costas, a conversar com quem estava ao seu lado, o governador do Ceará, Cid Gomes, também do PSB, mas hoje um devoto seguidor de Dilma. Gomes só fez agradecer as providências do governo em relação à seca, providências que, garantiu, o surpreenderam além das expectativas.
Pois o presidente de seu partido, e potencial adversário de Dilma em 2014, queria mais. E, como para colocar o dedo na ferida do governo e da própria Dilma, que é sua má gestão pública, falou em "inovação tecnológica" para proteger a base econômica da região, com a melhoria da qualidade do rebanho do Nordeste. O mesmo tipo de desencontro ocorreu ontem, na posse do novo ministro dos Transportes, César Borges. Rejeitada pelo PR inicialmente, sua escolha foi tentativa de Dilma de manter um mínimo controle sobre o ministério que havia dado tanta dor de cabeça a ponto de ter que incluí-lo na célebre faxina que foi sua marca de gestora nos primeiros momentos de seu governo.
Premida pelas necessidades eleitoreiras, Dilma teve de receber de volta tanto o PR de Alfredo Nascimento quanto o PDT de Carlos Lupi. Para quem se tem em altíssima conta como gestora, engolir esses dois sapos não deve ter sido fácil. A presidente fez análise curta e direta sobre a situação que o novo ministro encontrará pela frente, tão fria que parecia estar falando de outro governo, de "herança maldita" que chegara naquele momento às suas mãos.
Reconheceu que não há integração entre portos, aeroportos, ferrovias e rodovias, para completar o diagnóstico de que uma infraestrutura como a nossa só podia existir em "país míope". Como em terra de cego quem tem um olho é rei, em terra de míope quem é capaz de focar os problemas com tanta agudeza leva grande vantagem. A questão é que identificar os problemas não significa capacidade de resolvê-los.
O governador Eduardo Campos gosta de contar a seguinte história, para definir a maneira de governar da presidente Dilma: quando o Dnit revelou-se um antro de corrupção, a presidente nomeou para geri-lo o general Jorge Ernesto Pinto Fraxe. A corrupção acabou. Mas as obras também. Pois o novo ministro César Borges já sabe que não pode tirar o general do Dnit. Assim como teve que nomear o ex-ministro Paulo Sérgio Passos para a Agência Nacional de Transportes Terrestres. São os dois principais cargos de seu ministério.
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