É preciso desmistificar a noção preconceituosa de que a política é exercida somente por pessoas corruptas ou de mau caráter
A Gazeta do Povo inicia hoje a campanha Política Cidadã, com o objetivo de estimular os cidadãos a participarem do ambiente público do país tanto pela via partidária quanto pela via apartidária. É urgente resgatar o interesse pelo exercício da cidadania ativa, em especial se o Brasil quiser prosseguir no desenvolvimento de suas instituições e no fortalecimento da sociedade.
Atualmente há uma carência notória de engajamento político dos cidadãos. Uma das explicações possíveis para isso é a descrença da população em relação aos políticos. O impeachment do presidente Fernando Collor de Mello – o primeiro presidente eleito de forma direta depois da ditadura militar –, em 1992, foi apenas o início de uma série de escândalos políticos a que o país assiste desde então. Sucessivas denúncias de corrupção atingiram dirigentes políticos nos últimos 20 anos e muitos cidadãos passaram a rejeitar a ideia de se envolverem mais intensamente com o ambiente público. Frequentemente passaram a se dizer decepcionados com a política e optaram por um distanciamento “seguro” dos assuntos públicos, limitando o exercício da cidadania ao voto nas eleições que ocorrem a cada dois anos.
O grande problema é que a apatia social tem resultado em efeitos desastrosos para a vida em sociedade. Sem cidadãos atuantes, interessados em participar e influenciar no processos de tomada de decisão do Estado brasileiro, parte dos políticos se sente livre para se apropriar de bens públicos, desviar recursos e perseguir apenas os próprios interesses em detrimento de interesses mais amplos da comunidade. O distanciamento dos cidadãos em relação aos assuntos públicos contribui para ampliar as imperfeições da democracia brasileira.
Pesquisa recente mostrou que, pela primeira vez desde 1988, o número de brasileiros apartidários superou o de eleitores que dizem ter preferência por alguma legenda política. Segundo pesquisa do Ibope realizada em 2012, 56% dos eleitores afirmam não preferir nenhum partido, contra 44% que declaram ter preferência partidária.
Mas nem sempre foi assim. Há quase três décadas o país viveu um momento de intensa participação popular na política, com o movimento das Diretas Já e da redemocratização do país. Naquele período a população esteve mobilizada, reivindicando liberdade política. Contudo, o engajamento popular foi declinando à medida que os direitos civis iam se consolidando.
A campanha Política Cidadã tem a proposta de reconciliar as pessoas com o ambiente político. É preciso desmistificar a noção preconceituosa de que a política é exercida somente por pessoas corruptas ou de mau caráter. É preciso também apresentar instrumentos que permitam ao cidadão atuar de forma mais sistemática no mundo político. A campanha pretende fazer esse resgate e, para isso, conta com o apoio da sociedade.
Mas outro objetivo igualmente importante da campanha é fazer o cidadão perceber que a questão partidária é apenas um dos âmbitos da política, apesar de ser o mais visível deles. Muitas atividades e situações são importantes demais para que sejam deixadas apenas nas mãos do Estado e dos políticos: elas exigem a participação ativa da sociedade. Ontem mesmo, neste espaço, recordamos como a mobilização em defesa do Passeio Público, em Curitiba, partiu primeiro dos próprios curitibanos, para só depois ser encampada pelo poder público.
Esta Gazeta do Povo acredita firmemente que os principais protagonistas da ação pública devem ser os cidadãos, individualmente ou de forma organizada, em grupos, associações de bairro, entidades de classe ou qualquer outra maneira de congregar pessoas com objetivos em comum; ao poder público cabe complementar essa atuação auxiliando os esforços da comunidade e realizando as tarefas que a sociedade não consegue cumprir por conta própria. Exemplos desse tipo de protagonismo existem aos montes, alguns deles ressaltados também neste espaço, como o caso dos curitibanos que resolveram arborizar áreas da cidade, e dos empresários de Antonina que se uniram para reformar um trapiche. Pode não parecer à primeira vista, mas isso também é política, e da melhor forma: aquela que leva ao pleno uso daquilo que cada cidadão tem de melhor para oferecer aos demais.
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