A comunicação do governo com os agentes de mercado não vai nada bem. Com crescente intensidade, autoridades da Fazenda e do Banco Central (BC), com os mercados abertos, são mencionadas em notas "em tempo real" como fontes - anônimas ou não - de comentários sobre inflação, juros e câmbio, afetando, assim, os preços dos ativos financeiros negociados no mercado financeiro. Fossem tais manifestações coerentes entre si, o dano seria menor. Mas, com preocupante frequência, há contradições flagrantes entre as declarações colhidas pela imprensa.
Esse tipo de situação acarreta diversos inconvenientes. Em primeiro lugar, aumenta desnecessariamente a volatilidade dos preços dos ativos financeiros, gerando ganhos e prejuízos que provavelmente se distribuirão desigualmente entre os participantes do mercado, beneficiando as posições de caráter mais especulativo. Basta acompanhar a reação dos mercados de câmbio e juros futuros a certas manifestações do governo para ter ideia da redistribuição de ganhos e perdas que decorre dos sinais percebidos sobre a execução futura das políticas monetária e cambial.
Um segundo inconveniente decorre da criação de ruídos desnecessários na comunicação entre governo e mercado, dificultando a coordenação de expectativas, fundamental na execução das políticas monetária e cambial. Como as declarações são frequentemente desencontradas e tomadas fora do contexto, os agentes de mercado acabam mais perdidos do que cachorro em caminhão de mudança. Especificamente no contexto do regime de metas para inflação, manifestações sobre política monetária feitas por autoridades outras que não os membros do Comitê de Política Monetária (Copom) levantam a incômoda suspeita de que o BC teria perdido sua indispensável autonomia operacional.
Ademais, o desencontro muitas vezes percebido em tais manifestações pode ser tido como indicador de deterioração nas relações intragoverno, tudo parecendo que algumas autoridades teriam decidido usar a imprensa como canal para atingir companheiros de governo que não compartilham de suas opiniões ou refletindo uma pura e simples disputa por influência e poder. Obviamente, esse clima, se de fato existe, comprometeria a eficácia da política macroeconômica, podendo trazer consequências desastrosas em termos de estabilidade monetária e crescimento econômico. Como resultado, o mercado trabalha hoje com poucas certezas. Algumas perguntas relevantes seguem sem resposta. O regime cambial é mesmo de taxas flutuantes? Teria o BC autonomia suficiente para subir os juros, caso as pressões inflacionárias se agravem?
No caso do câmbio, poderíamos aqui citar declarações no mínimo risíveis, como a de que o câmbio seria flutuante, desde que não caísse abaixo de certo patamar. Até pouco tempo, o ministro da Fazenda sinalizava para um câmbio "confortável" acima do patamar dos R$ 2. Mas a taxa caiu e permanece abaixo desse patamar, ficando o dito pelo não dito. Para empresas que exportam, importam ou se endividam em moeda estrangeira, convenhamos, é uma confusão que pode custar muito dinheiro.
Quanto aos juros, a situação é ainda pior. Basta mencionar que os marqueteiros do Planalto, de modo muito pouco inteligente, decidiram tratar a queda (em grande parte conjuntural) dos juros como uma "conquista do PT", inclusive tendo incluído tal "feito" em manifestação da presidente Dilma na TV. Em decorrência, fica a questão irrespondida de como reagirão os políticos a uma eventual necessidade de subida das taxas pelo BC para controlar a inflação. Neste caso, alguém pode perder a face, e certamente não deverá ser a presidente.
Por tudo isso, é desejável que o governo unifique o discurso sobre os objetivos e meios da política econômica e se comunique com a sociedade da maneira mais transparente possível, evitando gerar volatilidade desnecessária nos mercados financeiros. Em particular, seria prudente que as manifestações sobre taxas de juros se mantivessem restritas aos membros do Copom.
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