O GLOBO - 27/02
Na essência da política de cotas há um aspecto que exaspera seus adversários: um estudante que vai para o vestibular sem qualquer incentivo de ações afirmativas tira uma nota maior que o cotista e perde a vaga na universidade pública. Quem combate esse conceito em termos absolutos é contra a existência das cotas, cuja legalidade foi atestada pela unanimidade do Supremo Tribunal e aprovada pelo Congresso Nacional (com um só discurso contra, no Senado). É direito de cada um ficar na sua posição, minoritária também nas pesquisas de opinião.
Uma coisa é defender as cotas quando a distância é pequena, bem outra seria admitir que um estudante que faz 700 pontos na prova deve perder a vaga para outro que conseguiu apenas 400. O que é diferença pequena? Sabe-se lá, mas 300 pontos seria um absurdo.
Os adversários das cotas previam o fim do mundo se elas entrassem em vigor. Os cotistas não acompanhariam os cursos, degradariam os curriculos e fugiriam das universidades. Puro catastrofismo teórico. Passaram-se dez anos, Ícaro Luís Vidal, o primeiro cotista negro da Faculdade de Medicina da Federal da Bahia, formou-se no ano passado e nada disso aconteceu. Havia ainda também as almas apocalípticas: as cotas estimulariam o ódio racial. Esse estava só na cabeça de alguns críticos, herdeiros de um pensamento que, no século XIX, temia o caos social como consequência da Abolição.
Mesmo assim, restava a distância entre o beneficiado e o barrado. O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais divulgou uma pesquisa que foi buscar esses números no banco de dados do Sistema de Seleção Unificada. Neste ano as cotas beneficiaram 36 mil estudantes. Pode-se estimar que em 95% dos casos a distância entre a pior nota do cotista admitido e a maior nota do barrado está em torno de 100 pontos. Em 32 cursos de medicina (repetindo, medicina) a distância foi de 25,9 pontos (787,56 contra 761,67 dos cotistas).
O Inep listou as vinte faculdades onde ocorreram as maiores distâncias. Num caso extremo deu-se uma variação de 272 pontos e beneficiou uns poucos cotistas indigenas no curso de História da Federal do Maranhão. O segundo colocado foi o curso de Engenharia Elétrica da Federal do Paraná, com 181 pontos de diferença. A distância diminui, até que no 20º caso, do curso de Ciências Agrícolas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Federal do Rio Grande do Sul, ela ficou em 128 pontos.
Pesquisas futuras explicarão como funcionava esse gargalo, pois, se a distância girava em torno de 100 pontos, os candidatos negros e pobres chegavam à pequena área, mas não conseguiam marcar o gol. É possível que a simples discussão das ações afirmativas tenha elevado a autoestima de jovens que não entravam no jogo porque achavam que universidade pública não era coisa para eles. Neste ano 864.830 candidatos (44,35%) buscaram o amparo das cotas.
A política de cotas ocupou 12,5% das vagas. Num chute, pode-se supor que estejam em torno de mil os cotistas que conseguiram entrar para a universidade com mais de cem pontos abaixo do barrado, o que vem a ser um resultado surpreendente e razoável. O fim do mundo era coisa para inglês ver.
Um comentário:
Ué !? Então vale retirar os direitos de 1000 pessoas ? Ora, não vale nem de uma ! Cotas sociais vá lá, não é o ideal. Mas cota racial é um crime. O pior é que os movimentos pró cotas NÃO aceitam solução que não seja a racial. É racismo mesmo, sem disfarce. Daqui a pouco alguém vai reparar que tem judeu demais na Universidade.....
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