FOLHA DE SP - 14/12
SÃO PAULO - Uma das mais notáveis capacidades do ser humano é a de imaginar o futuro e tomar decisões com o intuito de modificá-lo. É daí que surge a flexibilidade, característica em que superamos com folga nossos primos primatas bem como todos os outros animais.
É também a ferramenta de que nos valemos para escrever leis, que nada mais são do que a tentativa de regular o futuro. É claro que só faz sentido impor normas quando os comportamentos individuais não convergem de modo natural para a solução socialmente mais conveniente.
Imaginemos uma lei que proíba as pessoas de comer cocô de cachorro. Mesmo reconhecendo o valor sanitário da medida, ela é totalmente ociosa, já que a esmagadora maioria dos humanos não tem nenhum pendor em deliciar-se com dejetos caninos. Ao contrário, o impulso natural é nos afastar deles, daí a necessidade de norma que obrigue a recolhê-los quando nossos animais de estimação os depositam nas vias públicas.
Embora esse mecanismo seja até meio óbvio, nossos legisladores insistem em ignorá-lo. Um caso recente é a nova regra para a construção de garagens aprovada pela Câmara paulistana. O diploma reserva percentuais de vagas para bicicletas e motos em estacionamentos de condomínios e estabelecimentos comerciais.
Aparentemente, os vereadores se esqueceram de que condôminos e comerciantes têm interesse em resolver seus problemas. E eles, mais do que os parlamentares, conhecem as necessidades de seu público. Assim, uma loja de equipamentos para motos fará bem se reservar mais que os 10% fixados em lei para esses veículos. Algo parecido se aplica ao edifício onde ninguém tenha moto e falte espaço para carros. Em suma, vale a pena apostar na flexibilidade.
Minha suspeita é que só aprovam essas regras essencialmente inúteis para criar as dificuldades que gerarão o comércio de facilidades que infesta a administração pública.
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