sexta-feira, novembro 13, 2009

CARLOS MARCELO

No fio da navalha


Correio Braziliense - 13/11/2009


As autoridades brasileiras responsáveis pela gestão da energia podem ser acusadas de tudo, menos de falta de convicção na hora de apontar os culpados pelo apagão que deixou boa parte do país às escuras na noite de terça-feira. Impressionou a velocidade dos responsáveis pelo setor para garantir, todos afinados em um só discurso, que as causas do blecaute eram climáticas, não operacionais. Prontamente acionados, ocuparam a mídia para garantir que um fenômeno meteorológico de magnitude extraordinária teria sido o vilão da vez. Um dos parlamentares da base governista, sem medo de ser infeliz, chegou a comparar as possibilidades de ocorrer um apagão com as da queda de um grande avião.

A comparação é descabida também por conta da diferença na busca de respostas. Ao contrário do que ocorre após desastre aéreo, quando as investigações se prolongam por meses e meses por conta da cautela e minúcia do trabalho, em menos de duas horas o governo encontrou a chave do colapso e fez questão de alardeá-la de todas as formas — inclusive com longas entrevistas a rádio e televisão, algumas delas interrompidas para esclarecimentos ao presidente Lula. “Sobre o blecaute, o assunto está encerrado. Foi o que foi”, decretou o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. “O sistema é confiável, é robusto. Tudo isso foi feito pelo governo”, enalteceu.

Pena para o Brasil que não é bem isso o que dizem alguns especialistas. Caso do coordenador da Rede Integrada Nacional de Detecção de Descargas Atmosféricas, Osmar Pinto Júnior. Ele garantiu ontem que as chances de um raio ter causado o apagão são zero. “Tudo indica que foi um problema elétrico”, alertou. O prefeito de Itaberá (SP), cidade onde teria ocorrido a queda na transmissão, afirmou que não houve tempestade nem fortes descargas elétricas na noite de terça, apenas uma chuva de 35mm. A verdade é que, para exorcizar o fantasma de incapacidade gerencial que assombrou o governo FHC após os apagões e racionamento no início da década, o Planalto decidiu jogar toda a responsabilidade para os céus. Assim, optou por caminhar no fio da navalha, entre a convicção e o descrédito. Em caso de novo apagão, será que vai sobrar novamente para São Pedro?

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