segunda-feira, agosto 04, 2014

Problema crônico - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 04/08


No dia 20 de junho foi publicada uma nova lei reabrindo (pela quinta vez) o parcelamento de dívidas tributárias com a União. Pela portaria que regulamenta o decreto, os contribuintes em atraso terão até o dia 25 para aderir ao chamado Refis, parcelando em 180 meses seus débitos — incluindo valores atrasados de refinanciamentos anteriores. O Refis tem como principal atração a liberação de multas e juros de mora incidentes sobre as dívidas tributárias existentes.

A adesão ao programa está condicionada à antecipação de uma parte do pagamento, que varia de 5% a 20%, dependendo do valor da dívida acumulada. Os que devem à União menos de R$ 1 milhão anteciparão o menor percentual, e acima de R$ 20 milhões, o maior.

E aí é que parece estar a razão principal da reabertura do programa de refinanciamento.

São sempre bem-vindas iniciativas que ajudem os contribuintes a se manter em dia com suas obrigações tributárias. Simplificação, desburocratização, abertura de canais de comunicação com o fisco para que se faça a interpretação correta das normas, etc. Em face da elevada carga tributária no Brasil, há situações conjunturais em que a inadimplência de fato pode aumentar — por fatores às vezes alheios à gestão empresarial —, e a negociação é admissível, como acontece, por exemplo, no caso do crédito junto ao sistema financeiro. Tais negociações evitam que o contribuinte caminhe para um quadro falimentar, causando prejuízos que atingiriam, por efeito cascata, outros elos da cadeia produtiva.

No entanto, se a renegociação se torna rotineira, a inadimplência tende a deixar de ser involuntária para se tornar proposital. E, nesse caso, o contribuinte em dia acaba sendo prejudicado por uma concorrência desleal.

A motivação do governo federal nessa nova reabertura do programa de refinanciamento de dívidas não é doutrinária. Na verdade, o que existe é uma preocupação com o fluxo de caixa de curto prazo. Quando a lei foi promulgada, em junho, as autoridades fazendárias já sabiam que as metas fiscais que se propuseram a alcançar não seriam atingidas, pois a arrecadação não estava se comportando de modo a embasar o crescimento acelerado das despesas. Mais uma vez, a solução foi tirar do baú o programa de refinanciamento de dívidas, que tem um impacto inicial positivo sobre as receitas, devido às cinco parcelas que são inicialmente pagas como contrapartida à adesão ao Refis. Isso já aconteceu no passado. A outra fonte, que são os dividendos das companhias estatais, está secando, pois as empresas já não conseguem manter a mesma rentabilidade, até porque têm sido descapitalizadas.

O contribuinte mal-intencionado percebe essa fragilidade financeira do Tesouro. Depois de quitadas as parcelas iniciais de adesão ao programa, talvez passem a esperar por uma nova versão do refinanciamento. Então, as autoridades vão se deparar não mais com uma situação conjuntural, momentânea, mas como um problema que se tornou crônico.

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