O GLOBO - 25/04
Conselheiros da entidade escolhida para empréstimo renunciaram porque não podem se responsabilizar por uma operação tapa-buraco, sem garantias
Para evitar que o aumento do custo de geração de energia elétrica seja repassado em sua maior parte para as tarifas cobradas aos consumidores em 2014, o governo optou por uma fórmula que posterga esse ajuste. A justificativa para o represamento é que a inflação está em patamar muito elevado no momento e que, em breve, outros fatores poderão contribuir para uma queda nos preços da energia no mercado livre, o que, na média, atenuaria os reajustes futuros. Mas há, é evidente, um componente político nesse processo, pois em outubro serão realizadas eleições gerais, e um aumento mais significativo nas tarifas de eletricidade cobradas dos consumidores, em especial os residenciais, desgastaria ainda mais a imagem do governo, Dilma, que em 2013 anunciou em alto e bom som que esses valores sofreriam uma redução da ordem de 20% em decorrência de medidas adotadas — diga-se, de forma vertical, sem maiores discussões.
O Brasil tem uma matriz elétrica que hoje depende, na essência, dos humores do clima. Se, por um lado, ter quase 80% da geração a partir de hidrelétricas é para o país um ganho ambiental considerável (além de ser a fonte mais barata), por outro é inevitável que, nos anos de pouca chuva, os preços de energia subam, pois usinas térmicas, bem mais caras, precisam ser acionadas. Também por restrições ambientais, o Brasil não constrói mais hidrelétricas conjugadas a grandes reservatórios, de modo que, se não chove em volume suficiente para elevar a vazão das bacias que as alimentam, as novas usinas perdem capacidade de geração. Existem mecanismos de compensação dentro do próprio setor elétrico que, em condições normais, permitem apenas correções anuais nas tarifas cobradas dos consumidores. Mas, em anos atípicos, as empresas não têm fôlego financeiro para esperar vários meses “carregando” o encarecimento da energia que distribuem. O Tesouro resolveu, assim, continuar subsidiando a elevação desse custo, mas a conta acabou vindo alta demais, e não há recursos públicos disponíveis para tal. Surgiu então a ideia de concessão de um grande empréstimos bancário para as distribuidoras, cujo ônus seria repassado aos consumidores gradualmente, conforme o prazo de amortização do financiamento. A fórmula traz a marca da contabilidade criativa.
A entidade encarregada de realizar essa operação bilionária foi a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), que seria a responsável pelo financiamento, embora não tenha garantias para tal. Três dos seus cinco conselheiros da (a exceção foram dois indicados indiretamente pelo governo) renunciaram, pois é óbvio que não querem se responsabilizar, como indivíduos, por uma operação financeira “tapa-buraco” de tamanha magnitude. A confusão já era esperada devido à “politização” da modelo regulatório.
É pena que o governo tenha seguido por esse caminho em um segmento tão importante para a economia do país e o cotidiano das pessoas.
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