terça-feira, abril 08, 2014

Dilma, inflação e outros medos - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 08/04


Temor da inflação reflete ainda outras inseguranças, embora IPCA além de 6% seja problema

O SENTIMENTO de insegurança do eleitorado não parecia tão intenso desde as crises graves de 1999, da primeira grande desvalorização do real, e de 2001, do racionamento de eletricidade.

O pessimismo extraordinário aparece na enorme quantidade de eleitores que esperam um aumento da inflação. Mas o que está em jogo aqui não é apenas o aumento de preços.

Uma análise de 20 anos de números do Datafolha indica que nem sempre a expectativa de alta nos preços está relacionada à inflação do momento ou de notícias de carestia futura, mas também ao noticiário e a expectativas políticos, por exemplo. Decerto fica evidente que, quando a inflação passa dos 6%, em geral o temor de piora da carestia cresce bastante.

No entanto, ao responder à pergunta sobre inflação, o eleitor parece expressar um sentimento mais genérico de segurança a respeito do futuro.

Neste início de abril, 65% dos entrevistados diziam esperar uma alta da inflação, expectativa que vem em disparada desde março de 2013. Um mês depois do tumulto feio da desvalorização do real, em fevereiro de 1999, tal expectativa estava em 68%; a inflação estava em 2,2% ao ano. Em junho de 2001, plena crise do apagão, foi a 70%. O desemprego era alto, a inflação foi a 6% em 1999 e a 7,7% em 2001.

No entanto, a partir do ano muito ruim de 2002, com o Brasil semiquebrado, tumulto no mercado financeiro com a hipótese de vitória de Lula, dólar indo a R$ 4 e preços em disparada, o temor da inflação despencava. Caiu à metade do registrado em 2001 mesmo com o IPCA indo a 17,2% ao ano em maio de 2003, a pior crise inflacionária do real. Havia otimismo popular com Lula.

A expectativa de alta da inflação voltaria a dar um pulo em meados de 2005. A inflação aumentara de fato, mas para menos da metade da alta de 2003; na época, também estourava o mensalão. Outros repiques dos preços no final de 2008 e em meados de 2011 refletiram-se no medo da inflação captado pelo Datafolha.

No entanto, a escalada dos preços até meados de 2013 não influenciou de modo relevante a expectativa popular de inflação até os protestos de junho de 2013, embora houvesse certa falação sobre o assunto um pouco antes disso, vide a "crise do tomate". Mais impressionante, a partir de junho a disseminação da ideia de que a carestia vai aumentar foi tão ampla quanto em disparadas muito maiores da inflação, como em 1999-2002.

É fácil argumentar que a expressão "aumento da inflação" pode agora ter um significado diferente daquele de 1999, quando era fresca a memória dos horrores hiperinflacionários. Além disso, o eleitorado agora tem muito jovem que não viveu os tempos em que era corriqueira a inflação de 20% AO MÊS. Quase meia década de inflação de 6% AO ANO, com escapadas frequentes além disso, talvez hoje esgotem a paciência do cidadão mais rapidamente.

Ainda assim, parece haver desproporção entre alta de preços e tantos maus humores desde junho de 2013, que se refletem tanto na opinião econômica quanto política (na avaliação do governo). Ao que parece, não é apenas um ponto extra no IPCA que tem causado revertérios desde 2013.

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