O Estado de S.Paulo - 08/04
Será uma surpresa se o IPCA de março, previsto para ser divulgado depois de amanhã pelo IBGE, vier abaixo de 0,8%. Se der o esperado, uma variação da inflação ao consumidor que serve de baliza para o sistema de metas de inflação entre 0,8% e 0,9%, o acumulado em 12 meses chegará aos 6%.
Romper a barreira dos 6% é, no entanto, apenas um degrau na escalada da alta de preços que promete marcar a inflação em 2014. As projeções indicam que o teto da meta deverá ser ultrapassado em julho e por lá ficar até pelo menos setembro.
Mas não é só a alta de preços que está escalando. Em aparente contradição com teorias econômicas mais convencionais, a inflação não tem dado bola para outra escalada: a das taxas de juros. O Banco Central já promoveu nove altas sucessivas dos juros básicos, elevando a Selic em 3,5 pontos porcentuais desde abril de 2013, no mais prolongado ciclo de alta desde a introdução do regime de metas, em 1999.
Era inevitável, num quadro como esse, que o antigo debate sobre a eficácia da política monetária (política de juros) no combate à inflação ressuscitasse. Ao expor seus pontos de vista, defensores e críticos da aplicação de políticas exclusivas de alta dos juros para controlar alta de preços acabam acertando um outro alvo: as imperfeições do sistema de metas adotado no Brasil.
Os defensores de políticas monetárias mais puras encontram correlações negativas entre juros e inflação, ou seja, parecem seguros de que, em quaisquer circunstâncias, em algum momento depois da aplicação do remédio, taxas de juros mais altas levarão a taxas de inflação mais baixas. No fim da história, para eles, a culpa pela atual "ineficácia" da política monetária é do governo, que puxou, sem base nos fundamentos, a taxa de juros para baixo da taxa real de equilíbrio. Todo o esforço do último ano, de acordo com o argumento, serviu para trazer a taxa real de juros ao equilíbrio, mas, na situação atual, é preciso ir além da taxa neutra para derrubar a inflação.
É outro o entendimento dos críticos dessa visão. Para esses, o problema da aplicação da política de juros no controle da inflação residiria na escolha equivocada de um índice de preços ao consumidor cheio, caso do IPCA, como baliza do sistema de metas. O argumento desse grupo é o de que a eficácia de elevações de juros é baixa, nos casos de choques de oferta, repasse cambial, preços administrados e reajustes de preços por mecanismos de indexação. Quando se sabe que cerca de um quarto dos itens que compõem o IPCA tem preços administrados e quase um terço deles ainda mantém algum grau de indexação, vale a pena ir mais fundo nessa hipótese.
Com base na decomposição do IPCA, publicada pelo próprio BC, em quadros dos Relatórios de Inflação de março de 2013 e 2014, o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, montou uma planilha que permite comprovar o peso desses elementos na formação da inflação. Fica visível que o impacto inflacionário desses elementos menos afetados pela política de juros aumentou nos últimos três anos, em relação aos três anos anteriores.
Eles representaram um quarto do IPCA cheio, na média anual do período 2010-2013, enquanto não chegavam a um quinto, entre 2006 a 2009. Detalhe: o elemento "expectativa" manteve-se neutro entre 2006 e 2009, mas chegou perto de representar 10% da variação média anual, nos três últimos anos.
Com base nesses resultados, Borges pensa que poderia ser "interessante" se o BC adotasse, explicitamente, a partir de 2015, uma meta de inflação "ajustada", algo na linha do que foi feito em 2004, começando com 5,5%, em 2015, até alcançar os 4,5%, em 2016 ou 2017. Além de aliviar a política monetária, o BC, com recuperação da credibilidade, poderia coordenar as expectativas com mais eficiência.
Quem sabe não está chegando a hora de medir os custos e os benefícios de ajustar o termômetro.
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