O Estado de S.Paulo - 04/02
A falta de chuvas e as altas temperaturas deste verão podem causar, e na realidade já estão causando, grandes transtornos à população brasileira: os apaguinhos de energia elétrica, que poderão se transformar em apagões; a escassez de água nas cidades (a Sabesp anunciou descontos de 30% para quem economizar água); e graves problemas em projetos de irrigação de água pelo Brasil afora.
É lógico que ninguém pode culpar o governo, e muito menos a presidente, pelo péssimo regime pluviométrico nem tampouco pelo calor acima das médias históricas. A culpa do governo está no fato de não estabelecer um planejamento ou uma política para o setor elétrico em conformidade com a natureza climática do País e por não levar em conta a expansão do consumo de energia elétrica ocorrido com o advento de novos consumidores, que passaram a adquirir bens de consumo como ares-condicionados, por exemplo. Todos sabemos que o País depende muito da água para gerar energia elétrica e que no verão o consumo cresce por causa das altas temperaturas.
Mas, dada essa realidade climática brasileira, o que o governo promoveu de política energética nos últimos anos? Em setembro de 2012, para agradar ao consumidor e ajudar no controle da inflação, o governo publicou a MP 579, que obrigava as empresas geradoras de energia, bem como as transmissoras, a reduzir as tarifas, caso quisessem renovar suas concessões. Com a redução das tarifas de modo populista, sem nenhuma discussão com as empresas ou com os demais agentes do setor, o governo incentivou o consumo de energia elétrica sem que em nenhum momento tenha proposto um plano de consumo eficiente.
Da mesma forma que ocorreu com a gasolina, cuja importação aumentou 490% de 2010 a 2013, o consumo de energia cresceu turbinado pelo incentivo de crédito, neste caso para a aquisição de produtos da linha branca, e as usinas térmicas, mais caras que as hidrelétricas, passaram a operar todo o tempo. Mas como conciliar energia mais cara e, ao mesmo tempo, garantir a promessa da presidente de tarifas baratas? Aí entra o dinheiro do Tesouro Nacional, ou melhor, o nosso dinheiro, do contribuinte. Em 2013 o Tesouro colocou algo em trono de R$ 10 bilhões para garantir a promessa da presidente. Ou seja, Dilma Rousseff achou que podia revogar a lei da oferta e demanda no setor elétrico brasileiro.
Para azar do governo, no final de 2013 e início de 2014 a situação dos reservatórios das hidrelétricas continuou ruim e há uma forte onda de calor que está provocando recordes no consumo de energia elétrica. Sem sinal tarifário e sem um programa de uso eficiente de energia, a situação só piora, expondo a população ao desconforto dos apaguinhos e da escassez de água potável. Também o Tesouro, obrigatoriamente, terá de arcar com mais custos para manter a promessa da presidente até as eleições e evitar a quebradeira das distribuidoras de energia elétrica. Agora, além de arcar com a conta das térmicas, o Tesouro terá de ajudar as distribuidoras a pagar o preço do mercado livre, que atingiu o recorde de mais de R$ 800/MWh. Também por barbeiragem do governo, as distribuidoras estão descontratadas em quase 4 mil MW, já que os geradores não venderam energia nos leilões porque, mais uma vez, o governo fixou preços que trazem embutidas taxas de retorno patrióticas. Mais uma vez o mercado puniu e mandou a conta.
O governo precisa voltar a planejar, com P maiúsculo, respeitar as regras de mercado e ser menos intervencionista com espírito populista. O Brasil é um país rico em energia, dada a grande diversidade de fontes energéticas. É preciso promover leilões por fontes de energia e regionais, para que possamos absorver melhor a vantagem que a natureza nos deu. Também é urgente criar um grande programa de uso eficiente de energia, como tem sido feito nos últimos anos nos EUA. Não faz sentido, por exemplo, o País continuar fabricando chuveiros elétricos e deixar de fazer cogeração com o gás natural nos grandes centros urbanos.
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