O Estado de S.Paulo - 18/12
A transmissão de energia tem sido um dos entraves à expansão ordenada do Sistema Elétrico Brasileiro há vários anos: usinas de geração têm permanecido ociosas por causa dos atrasos na expansão das redes de transmissão.
Uma das principais causas para os atrasos é o licenciamento ambiental, que acaba prejudicando o cronograma das obras. Mas outra parte dos atrasos se deve ao fracasso de leilões em razão da baixa rentabilidade imposta pelo governo. Essa restrição tem resultado em leilões "vazios", situação que ocorre quando não há empreendedores interessados e que acaba adiando a entrada em operação das linhas de transmissão e a conexão de novas usinas.
Em todos os seis leilões de transmissão realizados nos dois últimos anos houve ao menos um lote em cada leilão não contratado. O motivo foi a falta de interesse derivada principalmente da baixa remuneração admitida pela Receita Anual Permitida (RAP) máxima estabelecida para cada lote ofertado no leilão.
Essa RAP máxima é definida com base na estimativa dos investimentos e do custo de capital. Ocorre que o custo de capital computado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) é definido com base em médias históricas, o que provoca um problema em situações como a que estamos vivendo, em que há reversão na tendência de queda do custo de capital. A redução da taxa de juros dos últimos anos foi interrompida e a curva de juros futuros indica elevação da taxa nos próximos meses e anos. Diante desse cenário, torna-se muito arriscado se comprometer com investimentos a um custo de capital incompatível com o que se projeta.
Para ter ideia da incoerência atual, o custo de capital atualmente estipulado pela Aneel para definir a RAP das concessões de transmissão é de 4,6% (em termos reais e após impostos). Esse patamar é bem inferior às taxas de juros em vigor para investimentos em renda fixa: 1) as NTN-B 2020 (Notas do Tesouro Nacional, série B, com vencimento em 2020) proporcionam retorno superior a 6% em termos reais; 2) a estrutura de juros privados para 2017 é superior a 12% em termos nominais, o que também corresponde a uma taxa real superior a 6%.
A Aneel promoveu a Audiência Pública 123/2013 para discutir o tema, mas sua tendência é de fazer apenas ajustes finos na sua metodologia de definição do custo de capital.
O governo e a Aneel cometem um erro grave e desnecessário ao impor uma rentabilidade implícita aos empreendimentos de transmissão, que acaba se tornando um entrave para o sucesso dos leilões. Seria muito melhor eliminar essa barreira acreditando nas vantagens promovidas pela dinâmica concorrencial. Nos últimos anos, grandes deságios foram obtidos nos leilões em razão da forte competição entre empreendedores.
Quando se impõe uma RAP máxima que embute custos de capital inferiores a outras opções de menor risco disponíveis no mercado de capitais, competidores racionais que poderiam intensificar a concorrência são excluídos logo de partida do leilão.
É preciso corrigir essa falha e permitir que a rentabilidade implícita seja disciplinada pela concorrência no leilão. Isso deve ser feito pelo estabelecimento de uma RAP máxima que seja, pelo menos, alta o suficiente para concorrer com outras opções de investimento disponíveis no mercado.
A camisa de força da Receita Anual Permitida máxima definida pela atual metodologia tem limitado a competição e postergado os investimentos na expansão da transmissão de eletricidade. Como consequência, tem prejudicado tanto a segurança de suprimento quanto a modicidade tarifária. As barreiras ideológicas que habitam algumas mentes (que insistem em querer impor limites artificiais e incoerentes) precisam ceder espaço à realidade expressa pelo fracasso dos últimos leilões e aos benefícios da livre e ampla competição. A insistência nesse erro tem custado caro ao consumidor de energia.
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