O GLOBO - 18/12
Nos 65 anos de existência do Estado de Israel, nenhum líder árabe aceitou considerá-lo como o Estado Judeu
Em março de 2005, o então vice-primeiro-ministro de Israel, Ehud Olmert, visitou o Brasil. Recepcionado no Rio de Janeiro, Olmert proferiu um histórico discurso que, passados oito anos, tornou-se uma peça ímpar de retórica míope de como alcançar a paz entre israelenses e palestinos.
Falando em nome do governo da época, liderado por Ariel Sharon, o vice defendeu a retirada israelense da Faixa de Gaza, o que foi concretizado em agosto do mesmo ano. Na defesa desta iniciativa, Olmert disse que o governo de Sharon, um general herói de guerra e considerado como inimigo radical pelos árabes, tinha a intenção de estender a mão aos palestinos, buscando um gesto pela paz. “É preciso arriscar”, disse Olmert em 2005.
Os anos que se seguiram trouxeram mais conflitos e menos entendimentos do que o preconizado pelo governo Sharon. Gaza virou uma base de terror e agressões anti-israelenses e, nas eleições palestinas de 2006, o Hamas venceu, vendendo a ilusão aos eleitores de que a retirada israelense tinha sido fruto das atividades belicosas do grupo contrário a Israel.
O Hamas se opunha ferrenhamente ao partido Fatah, de Mahmoud Abbas, sucessor de Yasser Arafat na presidência da Autoridade Palestina (AP). Já em 2007, o Hamas expulsou de Gaza o presidente da AP e todos os seguidores do Fatah, que fugiram para a Cisjordânia.
Estes episódios servem como exemplo para lembrar que o Oriente Médio é uma floresta de mata fechada. Para trilhar a região, é preciso conhecer bem o terreno e as armadilhas ocultas em seus caminhos.
Nestes dias, o presidente americano Barack Obama está aprofundando o seu envolvimento em dois tópicos que atingem o Oriente Médio, com possíveis reflexos em todo o mundo. Refiro-me ao acordo protelatório do Grupo dos 5+1 com o Irã, e as negociações de paz entre Israel e a Autoridade Palestina.
Nos últimos dias, o presidente Obama e o secretario de Estado, John Kerry, têm feito declarações que nos lembram o otimismo errático de Ehud Olmert, em 2005.
Obama fez a seguinte declaração no Saban Center for Middle East Policy, quando perguntado sobre as chances de sucesso do acordo com o Irã para cessar a corrida nuclear: “Eu não diria que é mais do que 50-50. Mas nós temos que tentar.”
Enquanto isso, Kerry acaba de fazer a sua nona viagem a Israel e Cisjordânia, como secretário de Estado. O prazo dado, de nove meses de negociações entre as partes, estabelecido em julho passado, num acordo liderado por Kerry, vai escoando sem qualquer sinal de progresso.
Nesta última viagem, o secretário americano tentou flexibilizar os israelenses, oferecendo garantias americanas à segurança do país, baseadas em dilatada presença militar na Cisjordânia, além de maior respaldo em caso de futuras necessidades militares.
Mas como aceitar promessas hegemônicas, num momento em que o genocídio praticado por Assad na vizinha Síria continua, apesar dos prazos e limites anunciados para uma intervenção internacional, e não efetivados por travas políticas no Conselho de Segurança da ONU?
Kerry parece ignorar que o problema entre palestinos e israelenses é muito mais de reconhecimento nacional do que de territórios e assentamentos. É preciso deixar claro que, nos 65 anos de existência do Estado de Israel, nenhum líder árabe aceitou considerá-lo como o Estado Judeu.
Enquanto persistir o enriquecimento de urânio pelo Irã e a negação palestina ao direito milenar de existência de uma nação judaica, qualquer otimismo precipitado pode ser a decepção e o desastre do amanhã. No Oriente Médio, nem sempre o mais lógico, ou o mais racional, prevalece.
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