A Seleção Brasileira de futebol, como diria Nelson Rodrigues, é a pátria de chuteiras. Gera uma corrente de esperança e paixão entre os brasileiros praticamente inquebrantável, mesmo para os mais desencantados e revoltados com a situação do país, como nos relata Cid Queiroz Benjamin em sua recém lançada e excelente biografia, intitulada Gracias a la vida (Editora José Olímpio). Mesmo nas prisões e no exílio, militantes radicais da oposição decididos a torcer pela derrota do Brasil acabaram comemorando, como os demais brasileiros, a espetacular vitória da nossa Seleção canarinho nos gramados do México, na Copa do Mundo de 1970.
Como se sabe, a gloriosa campanha do Brasil no México despertou muito patriotismo. Marcou o momento de maior apoio popular ao regime militar, então presidido pelo general Emílio Garrastazu Médici, que era um torcedor gremista fervoroso e chegou a frequentar o estádio do Maracanã de radinho de pilha ao ouvido, sob aplausos da torcida. Era a época do milagre econômico e a oposição, representada pelo MDB, sofreria nas urnas a sua maior derrota para a Arena. Nunca, até então, o futebol e o marketing político estiveram tão juntos.
Eis por que, como não poderia deixar de ser, a presidente Dilma Rousseff aposta suas fichas na vitória do Brasil na Copa de 2014, uma empreitada que herdou do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que tem uma certa dose de risco político. É que há muita contestação à realização do evento no Brasil, mais por causa do valor proibitivo dos ingressos para os jogos e das passagens aéreas para acompanhar o escrete nacional, pelas suspeitas de superfaturamento dos custos das obras de alguns estádios e não realização da maior parte dos projetos de mobilidade urbana, do que em razão de uma atitude antipatriótica dos que se opõem à realização dos jogos nos termos previstos pela Fifa.
Há muitas controvérsias sobre essa relação entre a política e o futebol, haja vista que uma coisa não está necessariamente ligada a outra, apesar de os cartolas e governantes fazerem o maior esforço possível para isso. A vitória de 1958, na Suécia, por exemplo, fez parte do ambiente de franco otimismo que pautou a vida nacional durante os anos do governo de Juscelino Kubitschek. Já a vitória de 1962, no Chile, não impediu o naufrágio econômico do governo Jango e o golpe militar que o apeou do poder.
Do ponto de vista da Copa de 2014, portanto, antes de mais nada, é necessário dizer que os principais candidatos de oposição, o senador Aécio Neves (PSDB), ex-governador de Minas, e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), são sócios da empreitada, pois ambos estão comprometidos, respectivamente, com a realização dos jogos em Belo Horizonte (MG) e no Recife (PE) e com o sucesso do Brasil, consequentemente. Isso, porém, não quer dizer que sejam solidários com o governo Dilma no caso de um eventual fracasso brasileiro na realização dos jogos. Eis a grande questão política posta pelo desempenho da Seleção para a reeleição da atual presidente da República.
Já nos assombra o fantasma da derrota da Seleção Brasileira de 1950, por 2 x 1, para a seleção do Uruguai, na final da Copa do Mundo, na qual o Maracanã chorou com aquele inacreditável gol de Ghiggia 11 minutos antes de o jogo acabar. É o responsável por aquele friozinho na espinha que sentimos ao saber que, por sorteio, o Brasil enfrentaria o México, a Croácia e Camarões logo de saída. Há que se considerar também o papel que os protestos contra a Copa das Confederações tiveram nas manifestações de junho passado.
De certa forma, uma insatisfação difusa está instalada e se traduz de forma bem-humorada no jargão “padrão Fifa” , que passou a ser adotado, ironicamente, nas críticas populares a tudo o que há de errado nos serviços públicos. Vamos todos torcer para que o Brasil ganhe a Copa do Mundo de Futebol de 2014. Quem corre mais risco político em caso de derrota, entre os candidatos nas eleições de 2014, porém, indiscutivelmente, é a presidente Dilma Rousseff, que trocou o radinho de pilha pelo Twitter e decidiu fazer dos jogos uma plataforma para a própria reeleição. Quem se desloca recebe, quem pede tem preferência, diria o mitológico botafoguense Neném Prancha. Mas, para ganhar o jogo, é preciso fazer os gols.
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