O Estado de S.Paulo - 30/11
Saiu ontem um pedaço do repetidamente anunciado e repetidamente renegado reajuste dos combustíveis.
Ao contrário do que prometera a Petrobrás em nota oficial há cinco semanas, não prevaleceu o ponto de vista da diretoria de instituir uma espécie de gatilho, que sempre seria acionado para ajustar os preços, tanto para cima como eventualmente também para baixo, de acordo com a evolução das cotações internacionais convertidas em reais pelo câmbio interno.
Em compensação, como está no comunicado divulgado ontem no início da noite, a Petrobrás está autorizada a reajustar gradualmente os preços até que convirjam aos patamares internacionais.
A decisão tomada ontem apresenta duas limitações: não recompõe a paridade internacional e, portanto, não recompõe totalmente a capacidade de investimentos da Petrobrás. Ela continua obrigada a pagar parte da conta do consumidor (subsídio), fator que, por si só, aumenta artificialmente o consumo. Em compensação, parece aceito o princípio de que esses represamentos têm de acabar. Se for isso, é bom sinal.
O governo estava emparedado e, aparentemente, tenta livrar-se disso, ao menos em parte. De um lado, não podia continuar sacrificando o caixa da Petrobrás, uma vez que estão previstos investimentos de R$ 236,7 bilhões em 4 anos. De outro, temia pela alta da inflação e pelos desdobramentos dos novos preços do diesel sobre as tarifas dos transportes urbanos, um dos fatores que mobilizaram as manifestações de junho.
Como é fato assiduamente lembrado, o estrangulamento dos preços dos combustíveis concorre para desestimular a produção de etanol, que não consegue concorrer com um combustível assim subsidiado. Apenas o reajuste de ontem não resolve o problema.
O que não é lembrado com a mesma frequência é o efeito sobre as contas públicas. Os combustíveis são produtos fortemente carregados de impostos. Um preço represado concorre, também, para a quebra de arrecadação do governo. Pelos cálculos da Consultoria Tendências, se o governo definisse tarifas da gasolina e do diesel equiparáveis às internacionais, a arrecadação de impostos federais e estaduais aumentaria em R$ 12,6 bilhões em 12 meses.
Alguns economistas de dentro e de fora do governo argumentam que, entre objetivos conflitantes, é preciso fazer uma espécie de média ou aquilo a que os ingleses chamam de trade off. Assim, tanto seria preciso atender em parte às necessidades de investimento da Petrobrás quanto ao combate à inflação. Em geral, quem apela para esse tipo de atitude é porque não quer decidir nada.
Não se trata apenas de passar graxa no caixa da Petrobrás. Há outras distorções a atacar, como o consumo excessivo de gasolina e o atrofiamento do setor do açúcar e do álcool, como lembrado acima. De mais a mais, salvo em casos excepcionais, a inflação não é gerada pelos preços dos combustíveis, mas, quase sempre, por uma condução flácida demais das contas públicas, como acontece agora.
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