O GLOBO - 01/11
A recente e surpreendente decisão do Ministro Luiz Fux de suspender o corte do ponto dos professores grevistas do Estado do Rio e de promover uma audiência de conciliação entre as partes é exemplar da inversão de papéis institucionais que vivemos hoje no país. Ao chamar à mesa de negociações governantes e grevistas, o ministro atua politicamente, avocando para o Judiciário um papel que originalmente não era seu, mas da classe política. Seria essa mais uma mostra da intromissão do Poder Judiciário na política ou mais uma mostra da falência da nossa classe política?
Desde junho, temos sido surpreendidos por uma explosão de participação nas ruas, com a multiplicação das marchas de protesto, pelos mais diferentes motivos, desde a remoção da Aldeia Maracanã até a redução da jornada de trabalho. O repentino despertar do gigante , com multidões de jovens, de cara pintada, reivindicando um Brasil melhor , deixou a todos atônitos. Intelectuais, autoridades, ativistas políticos maravilhavam-se diante do que parecia ser a nossa primavera, buscando explicações e arriscando prognósticos. O presente era lindo e o futuro radiante. Até que veio a violência. E a frustração. Neste momento, ficou patente o despreparo da nossa classe política.
As jornadas de junho injetaram nas ruas milhares de indignados de todas as idades, condições sociais e ideologias. Porém, a rejeição à política tradicional, vista como corrupta, e a toda liderança, privou os manifestantes de uma direção, isolou o movimento, diluiu suas reivindicações e abriu a porta para a violência. Os indignados deixaram as ruas, ocupadas pelos grupos radicais. E contra a força bruta, só a força bruta.
De um lado, os resistentes , como se autointitulam os black blocs, de outro, o Batalhão de Choque. Desde então, este tem sido o roteiro básico das nossas vidas. As manchetes ficam prontas nas redações à espera do dia seguinte: a manifestação, que começou pacífica, terminou em violência. E onde há violência não há política. O triste espetáculo das constantes batalhas nas ruas, depredações, prisões, ocupações de prédios públicos (e suas remoções igualmente violentas) e a indisponibilidade para o diálogo e a negociação parecem apontar para uma espiral de polarização e de banalização da violência.
Neste cenário de entropia crescente, cabe a pergunta: para quê serve a política? Onde estão os políticos? Talvez apostando perigosamente na política do quanto pior, melhor para colher dividendos políticos e eleitorais? A falta de canais de diálogo franco e efetivo tem nos levado à total abdicação da política. Tem nos levado a situações críticas e a grandes impasses. A tal ponto que o Judiciário teve que repolitizar uma questão jurídica, reinstaurando a negociação política como modo de solução de conflitos.
Se é verdade, como pensa Hannah Arendt, que o fim da política é o exercício da liberdade, em um ambiente de pluralidade, estamos indo na direção.
Nenhum comentário:
Postar um comentário