FOLHA DE SP - 01/11
Ou governo tem de 'fechar' até o fim do ano ou não vai cumprir nem de longe meta fiscal de 2013
O RESULTADO HORRÍVEL das contas do governo em setembro leva a gente, muita gente, a pensar em coisas desanimadoras, tais como:
1) O governo não vai atingir sua meta de "poupança" deste ano, bidu. Mas, para não ficar muito longe dessa meta, terá de cortar gasto em tudo e qualquer coisa, de guardanapo a investimentos "em obras". No entanto, Dilma Rousseff faz nesta semana reunião ministerial para "alavancar o investimento". Hum;
2) A despesa com "investimento em obras" não cresceu nos últimos 12 meses, em termos reais. Cresceram, bem, as despesas de custeio (em geral, transferências e benefícios sociais);
3) Poupando menos, o governo contribui menos para o controle da inflação (mais despesa, mais consumo, mais inflação, dada a situação atual da capacidade produtiva do país). É preciso fazer muita mágica e milagre aritméticos a fim de imaginar que o governo não está jogando lenha na fogueira.
O governo propôs em maio a meta de poupar 2,3% do PIB. Isto é, governo federal, Estados, municípios e estatais deixariam de gastar o equivalente a isso, desconsideradas as despesas com juros da dívida. É o que se chama de "superavit primário".
Na verdade, o governo federal atualmente conta em fazer um superavit de 1,35% do PIB. Para chegar aos 2,3% do PIB, diz o pessoal do governo federal, seria preciso que Estados e municípios fizessem um superavit de 0,95% do PIB.
Bem, o governo federal está fazendo uma poupança de 1,3% (na conta dos últimos 12 meses até setembro). Estados e municípios, de 0,4%.
Nada disso deve mudar muito até o final do ano. Em outros tempos, o governo federal "cobria a diferença" da eventual baixa poupança de Estados e municípios. Não mais, por ora. Até porque não tem dinheiro, dadas as reduções de impostos concedidas no ano passado.
O economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, consultor e colunista desta Folha, escrevia ontem em relatório que, noutros tempos, a gente podia contar com superavit primários de quase 1% do PIB nos Estados, ora em 0,3% do PIB, mau resultado inédito desde o final dos anos 1990.
Schwartsman, além de boa parte da torcida do Flamengo, observa que as coisas podem ficar ainda piores se for aprovada a renegociação (redução) de dívidas estaduais e municipais com a União, que abriria a porta para mais gastos.
A piora das contas do governo e a ameaça de liberdades com a Lei de Responsabilidade Fiscal (que em tese veta a renegociação da dívida de Estados e municípios) tornam mais provável um rebaixamento da nota de crédito do Brasil (na prática, com menos crédito, governo e empresas pagariam juros maiores, entre outros estragos).
O ex-ministro Delfim Netto, consultor informal do governo, escrevia na semana passada que o eventual rebaixamento da nota de crédito e o tumulto que virá com a mudança da política monetária americana, em 2014, podem causar a "tempestade perfeita", uma confluência de fatores de mau tempo que balançaria o nosso coreto: juros em alta no mundo, estiagem de capital externo, desvalorização rápida do real, estiagem no crédito doméstico e, enfim, alta horrível de juros domésticos. Isto é, na prática, queda do salário real e do nível de emprego.
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