O GLOBO - 19/09
É da natureza do Estado a criação de tributos. Em princípio, teria delegação da sociedade para esse fim com o propósito de executar tarefas de interesse comum a todos, como a defesa do território, a segurança pública, a justiça, o controle da moeda, a preservação ambiental e outras ações essenciais para o bom convívio dos cidadãos. A capacidade de criar impostos não é ilimitada, pois pode asfixiar o contribuinte a ponto de impedir a geração de renda, que é a base sobre a qual se pode recolher tributos. Portanto, nessa função, o Estado pode matar a galinha dos ovos de ouro, o que levaria ao seu próprio desmantelamento. Na prática, o Estado está sempre testando esse limite. Recua quando percebe que se aproxima do sufocamento do contribuinte, mas volta a apertar o torniquete se vislumbra qualquer folga.
Esta semana temos várias provas de como isso se passa. Enquanto a discussão sobre reforma tributária segue em ziguezague, ora avançando, ora retrocedendo para o limbo, medidas pontuais surgem para manter ou aumentar a carga tributária.
Em sua edição de ontem, o jornal “Valor Econômico” anunciou no alto da primeira página que uma Instrução Normativa (de número 1397) da Receita Federal ressuscita o padrão contábil brasileiro antigo, embora desde 2008 as empresas gradualmente venham adotando normas internacionais aceitas pelo país. Essas duas contabilidades causarão enorme confusão e aumentarão os custos das empresas obrigadas à duplicidade. Tudo porque a autoridade fazendária identificou nesse processo a possibilidade de arrecadar mais impostos. Tratando-se de uma instrução normativa, de caráter administrativo, a iniciativa poderia até passar despercebida, pois geralmente é acompanhada apenas por especialistas.
Mais estapafúrdia ainda foi a negociação entre o governo e o Congresso para que seja mantida a multa adicional de 10% estabelecida anos atrás para equilibrar as contas do FGTS. Tais recursos já cumpriram completamente essa finalidade (cobrir perdas causadas por planos econômicos), mas, agora, serão mantidos infinitamente. A multa virou imposto (!). Para que o Congresso não se sentisse constrangido em referendar essa perpetuação, o governo envelopou a decisão em um objetivo socialmente nobre, que é o financiamento do programa Minha Casa, Minha Vida (na verdade, esses recursos deveriam sair das verbas ordinárias do Orçamento da União e não de multa em rescisão de contrato de trabalho).
O Legislativo, por sua vez, quis dar sua “contribuição” exclusiva para esse festival, facilitando a tramitação de projetos de leis complementares que ampliam o número de categorias com direitos a aposentadorias especiais. Se aprovadas, encurtarão para 25 anos de trabalho formal o prazo para requerimento do benefício por essas categorias. E de onde sairão os recursos? Dos contribuintes, pois a Previdência ostenta enorme déficit.
A economia brasileira nem voltou a se recuperar e já se entra numa fase de retrocessos.
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