REVISTA VEJA
É disso, e só disso, que se trata. Fala-se uma enormidade, e cada vez mais, sobre o "quadro sucessório"; todo mundo "trabalha com a hipótese" de alguma coisa. (É uma das curiosidades da nossa atual linguagem política: aboliu-se o verbo "pensar". Hoje o indivíduo não pensa — só "trabalha com a hipótese".) Mas o que está valendo mesmo, no jogo a dinheiro, é a corrida de uma multidão de gente para salvar o próprio couro. Até dois ou três meses atrás, esse era um problema inexistente: o governo tinha certeza de que Dilma "estava eleita já no primeiro turno". Mas a coisa mudou de repente, e o medo de perder invadiu o PT e a base aliada. Já apareceu um "volta Lula", tramado no escuro por ele mesmo, para desmanchar a candidatura de Dilma à reeleição; e os aliados, assim que sentiram o primeiro cheirinho de pólvora no ar, voltaram ao bazar de compra e venda do seu apoio.
As perdas materiais, aí, envolvem gente que não acaba mais. Quantos serão? É difícil saber ao certo. Entram, logo de cara, além dos 39 ministros que pretendem estar no próximo governo, perto de 25 000 funcionários de "confiança" nomeados livremente pelo presidente e sua turma — aos quais se devem somar os empregos que podem dar nas empresas estatais. Muitos desses cargos são coisa de cachorro grande: a prova mais recente foi a batalha que o senador Fernando Collor ("aliado") travou para substituir os ocupantes de dois empregos na Petrobras por gente sua. Brigou e levou: Dilma. que já não tinha escolhido os dois que estavam lá, também não escolheu os seus substitutos, em mais um belo retrato de como funciona seu governo. Some-se a isso a grossa maioria dos 594 deputados federais e senadores, e a miudeza política que sobrevive nos subúrbios mais distantes do poder central. Não se pode esquecer, é claro, todo o mundo multibilionário e opaco dos fundos de pensão gerenciados pelo PT e chefes sindicais — adicione-se a eles, aliás, a nata do mundo sindical petista. Multiplique-se, enfim, tudo isso pelo número de parentes, amigos, amantes, sócios etc. dessa turma, e já estamos falando numa quantidade de gente na casa dos seis algarismos. O leitor fica convidado a fazer sua conta pessoal.
Falta acrescentar, ainda, os privilégios dos donos do poder, e que valem tanto quanto dinheiro sonante. Um caso, entre milhares, ajuda a entender com perfeita clareza por que é indispensável, para o PT e a base aliada, manter o governo em 2014. Trata-se da última obra que o governador Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro, colocou em sua biografia. Cabral, que há anos vive ajoelhado diante de Lula, mandou buscar seu cachorro "Juquinha", em sua casa de praia em Mangaratiba, num Agusta AW109 Grand New que faz pane da frota de sete helicópteros do governo estadual, mantidos ao custo estimado de 10 milhões de reais por ano. República? Está mais para corte de Maria Antonieta tropical. Ao povão do Rio, nessa fantasia, fica reservado o papel dos barões famintos e napoleões retintos que desfilam no samba Vai Passar, de Chico Buarque.
Talvez esteja aí, no fundo, o problema real da política brasileira de hoje. Se o PT cair fora, quem vai mandar o helicóptero buscar "Juquinha" em Mangaratiba?
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