Diante da indignação com o desperdício de recursos públicos pelas comitivas presidenciais no exterior, o governo, em vez de buscar a moralização, prefere adotar o sigilo para as informações referentes às viagens
A mão que afagou a opinião pública ao sancionar, em 2011, a Lei do Acesso à Informação, um dos mais importantes instrumentos para obrigar os governos a dar total transparência a seus atos, é a mesma que agora determina que todas as despesas de viagem da presidente Dilma Rousseff devem ser mantidas sob sigilo absoluto. A ordem emitida pelo Palácio do Planalto vale até o fim do presente mandato ou, em caso de reeleição, até 2018.
Com a popularidade despencando em razão dos maus resultados da economia, uma combinação perversa de inflação alta com crescimento próximo do zero, a presidente da República prefere atropelar o preceito constitucional da publicidade dos atos oficiais (artigo 37) a correr o risco de se ver, outra vez, flagrada em gastos absurdos que costumam pagar seus périplos internacionais. Com o que acredita diminuir a conta dos prejuízos eleitorais.
O caso mais exemplar desse tipo de desperdício ocorreu em março último, quando da inauguração do pontificado do papa Francisco: Dilma e sua comitiva ocuparam quase metade de um hotel de luxo em Roma, entre quartos e salas de apoio, desembolsando pelos três dias de permanência nada menos de 125 mil euros, o equivalente a R$ 324 mil. A despesa poderia ser muito menor se a presidente se hospedasse na embaixada do Brasil – o famoso Palácio Pamphili, ironicamente o mesmo local que dispunha do “quarto vermelho” para acolher Rosemary Noronha, ex-chefe do gabinete presidencial em São Paulo, em suas viagens de recreio à capital italiana.
A partir de agora, despesas de viagens presidenciais são segredo de Estado. As embaixadas brasileiras ao redor do mundo foram alertadas a respeito por meio de mensagem telegráfica disparada pelo Itamaraty, que decidiu reclassificar como “reservados” os documentos atinentes às estadias no exterior. A reclassificação, informa o Ministério das Relações Exteriores, está sendo realizada como parte da adaptação à Lei de Acesso à Informação. “Com a maior facilidade para o acesso aos expedientes internos do ministério, analisou-se que seria necessário reclassificar documentos que possam pôr em risco a segurança da presidente e do vice-presidente”, argumenta o Itamaraty.
Ora, a menos que haja o temor de que a presidente e seu vice sejam alvos de apedrejamento por parte de populares revoltados com a gastança, não há como entender a justificativa de que a divulgação dos gastos possa “pôr em risco a segurança” de ambos. Logicamente, a explicação se esvai no campo das mesquinharias político-eleitorais, de que o PT (o partido que nasceu sob a bandeira da defesa da ética!) faz uso com prodigalidade incomum.
Sob tal raciocínio, se esconde o desejo de não deixar a população (leia-se eleitores) conhecer fatos que produzam desgaste à imagem presidencial e comprometam minimamente suas chances de se reeleger em 2014 já no primeiro turno. Por esse jogo de esconde-esconde já passou, por exemplo, o caso do mensalão, e agora se eleva até para o patamar do falseamento de índices e dados contábeis para não revelar a profundidade do descontrole das finanças públicas.
Viagens presidenciais ao exterior estão na esfera de suas obrigações e prerrogativas institucionais. São importantes para o estreitamento das relações diplomáticas, para o incremento das trocas comerciais e para a atração de investimentos. Entretanto, se realizadas com gastos excessivos e desnecessários, passam a se constituir num desrespeito aos brasileiros contribuintes. E isso é tudo quanto não merecemos.
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