O GLOBO - 20/06
O Poder Judiciário da Argentina voltou a demonstrar disposição de se contrapor à avalanche autoritária do governo kirchnerista, que visa a dominar as instituições do país à maneira bolivariano-chavista. A Corte Suprema de Justiça declarou inconstitucionais os artigos-chave da lei de reforma judiciária proposta pela presidente Cristina Kirchner e aprovada pelo Congresso, onde o governo é majoritário.
A Corte deixou sem efeito os principais pontos da reforma do Conselho da Magistratura, órgão encarregado de designar e julgar a atuação dos juízes no país. Os dispositivos impugnados são os que determinam a eleição popular dos integrantes do Conselho, a nomeação e destituição dos juízes por maioria simples e a elevação do número de integrantes de 13 para 19. Foi um duro revés para o governo, na sua tentativa de subjugar o Judiciário, ou seja, acabar a independência entre Poderes, básica na democracia representativa.
O dispositivo crucial era a eleição direta de novos integrantes do Conselho, vinculando-os a partidos políticos e comprometendo sua isenção. A reforma foi derrotada por 6 a 1, e o voto vencedor anotou que “a lei contraria a imparcialidade do juiz frente às partes de um processo e de toda a cidadania, já que lhe exige identificar-se com um partido político(...).
Uma das motivações para a reforma pretendida pela Casa Rosa foi a decisão da Câmara Civil de Buenos Aires de prorrogar liminar que protege o Grupo Clarín de artigos da Lei de Meios, como o que obrigaria a maior holding de comunicação da Argentina a se desfazer de boa parcela de seus veículos audiovisuais. A investida do governo K contra a liberdade de imprensa é mais uma de suas facetas chavistas.
A ação da Corte Suprema foi saudada nos meios jurídicos. O presidente do Conselho da Magistratura, Mario Fera, disse confiar que “os funcionários do governo vão entender que a sentença é um sinal institucional que é necessário respeitar, provém da cabeça do Estado, do órgão encarregado de interpretar a Constituição”. Ressalte-se que Fera foi eleito em fevereiro com os votos do kirchnerismo, bloco mais forte dentro do Conselho.
Já o governo não escondeu o desgosto, chegando o ex-chefe de Gabinete e atual senador Aníbal Fernandez a dizer que “a Justiça está se metendo onde não deve”. O deputado kirchnerista Carlos Kunkel chegou a comparar o veredicto a “uma nova forma de golpismo”.
Ambos tentam inverter a questão. O governo é que mete a mão onde não deve — no necessário equilíbrio e independência entre os Poderes —, e com isso se aproxima do golpismo. A Justiça argentina, nestas circunstâncias, tem se mostrado à altura do desafio de manter o que resta da democracia no país, diante do poder autoritário e avassalador do governo de Cristina K. A resistência do Judiciário do país vizinho é importante para as forças democrática em todo o continente.
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