FOLHA DE SP - 20/06
RIO DE JANEIRO - "Vivi um inferno", resumiu a servente da Assembleia Legislativa do Rio, uma das várias pessoas que ficaram presas, apavoradas, dentro do Palácio Tiradentes, na noite de segunda-feira. Cercado pela turba, o palácio parecia prestes a ser tomado. Mas isso só faria sentido há dois séculos.
Seu corpo ainda doía. O som das vidraças se quebrando --agora por quem recuperava o que havia sido destruído por gente com rosto escondido no meio da já histórica passeata-- fazia lembrar a noite de terror vivida poucas horas antes.
O espaço da Assembleia é um dos palcos preferidos de manifestantes de todos os tipos e origens no Rio. Por lá passaram personagens anônimos e protagonistas da história do país.
Nos tempos coloniais, o mesmo local abrigava a Cadeia, onde ficaram presos inconfidentes, como Joaquim José da Silva Xavier, executado em 21 de abril de 1792. E também o Legislativo que, em 1888, nos tempos do Império, aprovou a lei que aboliu a escravidão. Em 1891, viu nascer a primeira Constituição republicana.
Em 1922, Cadeia e Câmara foram demolidas, dando lugar ao feioso prédio de estilo "eclético", tombado em 1992, após um acirrado debate sobre o merecimento de tal glória, e batizado com o nome de Tiradentes.
Em sua fachada ficou pendurada gigantesca foto de Getúlio Vargas, no ano de 1941, nos moldes dos grandes ditadores. Pouco depois, sediou a democrática Constituinte de 1946.
Hoje, mais do que no plenário, é na escadaria que a história tem sido escrita. Para lá, dirige-se quem pede melhor salário, mais saúde e educação ou o fim da corrupção.
O Palácio Tiradentes viu de tudo na história. Em casa de enforcado, não se deve dar corda para violência nem para intolerância, mas suas portas têm de estar abertas ao que vem da rua. Tudo indica que seus degraus continuarão a ser subidos por quem começa a dizer o que quer.
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