GAZETA DO POVO - PR - 09/05
Para colocar em prática o plano de ampliação contínua da produção de alimentos, o país precisa de um planejamento orquestrado, com investimentos em rodovias, ferrovias, portos marítimos e armazenagem
A safra recorde de milho de inverno criou uma situação inusitada que envolve o agronegócio, a economia e o governo brasileiro. O país aumentou a produção, mas não tem estrutura para armazená-la. Como as exportações devem recuar, os preços estão caindo, e o governo terá de socorrer os produtores gastando milhões para garantir preço mínimo e equilibrar o mercado. E a saída não é recuar na produção, mas sim investir em planejamento e infraestrutura.
O volume de milho que está saindo do campo deve chegar a 40,6 milhões de toneladas, mostra levantamento da Expedição Milho Brasil, projeto da Gazeta do Povo. A tradicional “safrinha” deve resultar um volume 12% maior que a produção de milho de verão. As duas colheitas chegam a 76,9 milhões de toneladas, volume 45% maior que o consumo doméstico. Os cerca de 25 milhões de toneladas restantes não deverão encontrar espaço suficiente no mercado externo. Precisariam ir para os armazéns, que em muitas regiões simplesmente não existem.
O Brasil tem capacidade de armazenagem estática estimada em 121 milhões de toneladas, conforme a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Mas produz em 2012/13 perto de 185 milhões de toneladas. Ou seja, 35% da colheita desta temporada não têm abrigo. Os especialistas no assunto afirmam que, para evitar essa contradição exposta pelo milho de inverno, o Brasil deveria contar com capacidade de armazenagem de 221 milhões de toneladas, suficiente para armazenar o equivalente à produção atual com 20% de folga.
Mas construir armazéns para 100 milhões de toneladas de grãos vai levar tempo. E depende de um plano nacional, uma vez que não há armazéns suficientes em nenhum estado. Na Bahia, por exemplo, o déficit absoluto – a diferença entre a produção e a capacidade dos barracões – chega a 56%. Mesmo o Paraná, apontado como referência em infraestrutura, precisa ampliar a capacidade de armazenagem em 38% para guardar a safra 2012/13, e Mato Grosso, o maior produtor nacional de grãos, 40%.
Houve aumento na procura por recursos a juros reduzidos (5,5% ao ano) para construção de armazéns. E a capacidade de armazenagem evolui mais rapidamente que as estatísticas. Mesmo assim, o déficit prevalece, o que mostra que não basta viabilizar os projetos. Falta planejamento por parte do agronegócio e do governo. Só assim haverá espaço suficiente para uma safra de mais de 200 milhões de toneladas, volume que deve ser atingido ainda nesta década.
Como não há espaço nos silos, uma das saídas é a exportação. Na temporada passada, o Brasil exportou volume recorde de milho. Embarcou 22 milhões de toneladas, o dobro do recorde anterior, registrado em 2009/10. A façanha foi possível porque houve aumento na produção brasileira num período em que os Estados Unidos registraram quebra histórica. Mas não se pode contar com quadro semelhante em todas as safras.
Se as exportações não derem conta de escoar a safra, a sobra de grãos no mercado interno forçará a oferta de produtos que poderiam ficar armazenados e derrubará os preços ao produtor. Como medida paliativa, o governo teria de oferecer incentivos para garantir a comercialização de cerca de 4 milhões de toneladas de milho, uma despesa que chegaria a R$ 500 milhões caso as cotações do cereal caiam bruscamente.
Sem planejamento, o Brasil tende a continuar pagando uma conta mais alta que a da construção de silos. Para colocar em prática o plano de ampliação contínua da produção de alimentos, o país precisa de um planejamento orquestrado, com investimentos em rodovias, ferrovias, portos marítimos. Os armazéns, nesse contexto, representam uma tarefa básica, caseira e indispensável.
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