ESTADÃO - 09/05
Era difícil de enxergar isto com clareza, mas o governo Lula recebeu a bola da gestão anterior prontinha para marcar o gol. As reservas em dólares tinham começado a crescer, os sistemas de câmbio flexível e de metas de inflação funcionavam bem, ao tempo que os resultados fiscais primários tinham alcançado a marca de 3,1% do PIB, partindo de zero em 1998.
Por dificuldade de enxergar o que tinha acontecido e o que viria a seguir, havia o temor de explosão da razão entre a dívida pública líquida de ativos financeiros e o PIB, qualquer que fosse a inclinação do novo governante em relação à questão fiscal.
Dados o elevado estoque inicial de dívida, a taxa Selic real e a taxa de crescimento do PIB com que se raciocinava para projeções dessa mesma razão, e supondo, ainda, a taxa de câmbio constante, o superávit primário requerido para estabilizá-la se situava bem acima de 3% do PIB, algo visto como quase impossível de pôr em prática, depois de todo o penoso ajuste feito até então. A taxa Selic real esperada, na mente dos analistas, era de 11% ao ano. A taxa de crescimento do PIB considerada nos cálculos era da ordem de 2,7% ao ano, média observada em fase próxima precedente.
Assim, a economia brasileira estava travada, por não ser possível antecipar que o IBGE divulgaria uma nova série do PIB com valores 10% maiores que a série em vigor e que o mundo explodiria em liquidez e crescimento. Pelo primeiro fator, a razão dívida/PIB passaria de 50% para 45% de uma tacada só. A explosão de liquidez jogaria para cima a relação entre os preços de exportação e de importação do Brasil - forte ganho de termos de troca - e inundaria o País de capitais. Graças a isso, as altas taxas de juros reais, que agiam como uma pesada trava no funcionamento da economia brasileira, poderiam rapidamente cair - como de fato ocorreu - para níveis há pouco inimagináveis. E, logo em seguida, o PIB poderia subir a uma velocidade também fora da maioria das previsões, o que seria facilitado pelas altas taxas de desemprego em vigor, ou seja, pelos baixos níveis de utilização de capacidade.
Veio a crise e o Brasil foi um dos países emergentes a superá-la mais rapidamente. De lá para cá, contudo, vai ficando cada vez mais evidente que o modelo econômico que vem sendo adotado desde os primeiros momentos do governo Lula, e que ganhou novos contornos diante da crise e das novas prioridades do governo Dilma, está se esgotando. Uma análise aprofundada desse esgotamento seria longa demais para o espaço deste artigo. Mas o fato é que, ao contrário da maioria dos países emergentes, o Brasil pós-crise passou a crescer menos e está perdendo o controle da inflação. A precipitada antecipação da campanha de Dilma Rousseff à reeleição torna preocupante o quadro econômico atual, em vista da paralisia na adoção de medidas impopulares que tomou conta da ação governamental.
Na apresentação que farei com parceiros no Fórum Nacional Inae/BNDES, na semana que vem, um dos destaques será a deterioração recente dos resultados fiscais, que se encaixa nesse quadro de esgotamento e que o governo inexplicavelmente tem procurado esconder por meio de artifícios contábeis e outras medidas do tipo.
A verdade é que, em vista da melhoria dos parâmetros que afetam a evolução da razão dívida/PIB, os superávits primários poderiam cair até certo ponto sem comprometer a credibilidade fiscal do País. O problema, hoje, é que devemos estar chegando ao limite máximo de possibilidades dessa queda, enquanto o governo terá, desnecessariamente, perdido grande parte da credibilidade acumulada no passado no que toca a prometer e cumprir metas na área fiscal. Isso já se vê, inclusive, pela evolução desfavorável de indicadores de risco Brasil relativamente a outros emergentes desde 2012.
Acompanhar a implementação de metas fiscais ficou cada vez mais difícil, especialmente para investidores de fora, e o Brasil vai queimando cartuchos acumulados com tanto sacrifício.
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