BBC Brasil
83 anos. Alerta, passo firme, telegênica. Uma das mulheres mais afluentes e influentes da televisão americana, Barbara Walters vai sair do ar daqui a um ano. Ou quase.
Não fará mais programas semanais, entre eles seu View, que criou e foi modelo de Saia Justa e tantos outros. Nem terá participações regulares na ABC, mas vai continuar a dar as caras em projetos especiais.
"Quero ter mais tempo para cheirar as rosas", foi uma das razões que levaram Barbara a tomar a decisão que começou a matutar quando fez 70 anos.
Nossas vidas, além de uma válvula aórtica suspeita, têm pontos comuns. Poucos. Quando a carreira dela deu uma guinada extraordinária e Barbara se tornou a primeira mulher a apresentar um jornal de rede eu levei a primeira bronca da minha carreira, que começava na rede Globo.
Minha editora-chefe, Alice Maria, mais tarde querida amiga, me mandou um fax cobrando o furo que eu tinha levado de outra amiga já querida, Sonia Nolasco, na época casada com Paulo Francis e correspondente de O Globo. Uma entrevista com Barbara Walters.
Sonia teria conseguido a entrevista que ninguém conseguia. Quando foi contratada pela rede ABC, por US$ 1 milhão por ano, então o salário mais alto do jornalismo americano, Barbara queria se livrar do estigma de celebridade entrevistadora de celebridades. Nada de entrevistas, badalações em colunas sociais e fotos em festas. A imprensa "séria" acusava a rede ABC, com a co-âncora Barbara, de tirar a seriedade dos jornais.
Sonia conseguiu permissão para ir ao set do estúdio acompanhar uma apresentação dos bastidores. Mandou a matéria, usou algumas citações de Barbara conversando com sua equipe e o jornal deu destaque à "entrevista" que a própria Sonia disse não ter acontecido.
A carreira de Barbara e a minha foram adiante, a dela com mais dólares do que a minha. A contratação da entrevistadora e ex-apresentadora do programa matinal Today, da NBC, era parte de um plano maior do novo chefão do jornalismo, Roone Arledge, para tirar a ABC do distante último lugar. Até então, ele revolucionava as coberturas esportivas na rede ABC, com os melhores salários e novas tecnologias. Quando assumiu o jornalismo, achou que podia transformar jornalistas em estrelas campeãs de audiência.
Houve um derrame de dólares numa época em que o maior dos âncoras, Walter Cronkite, no final de carreira, ganhava US$ 650 mil por ano.
O plano de Roone deu certo. Não foi com a rapidez que ele queria, mas a rede, mesmo sem Barbara na ancoragem, saltou para o primeiro lugar. A química entre ela e o veterano co-apresentador não deu certo.
Depois de três anos ela saiu para apresentar outros programas e especiais que deram prestígio e fortuna à rede. Nem Oprah entrevistou pessoas tão relevantes. O raio de ação de Barbara era de 180 graus, várias entrevistas com líderes políticos tiveram repercussão mundial.
Até a década de 70, o jornalismo televisivo dava prejuízo. Os presidentes das redes batiam no peito e anunciavam com orgulho que prestavam um "serviço público". Com jornalistas milionários e célebres, a chegada do videoteipe, satélites e escritórios espalhados pelo mundo, os gastos das redes e o faturamento com os comerciais se multiplicaram.
Era também o começo da televisão por assinatura, que até então era usada em áreas rurais para melhorar a qualidade da imagem. A CNN nasceu em 1980. Na década de 90, surgiu a internet.
Foi neste período de influência, prestígio e salários altos dos jornais de rede que começou a lenta queda de audiência, não só dos jornais, mas de toda a programação e a ascensão das TVs por assinatura.
A trajetória de Barbara Walters vai do berço de ouro de jornalismo aos picos de audiência e à decadência. Não só do jornalismo.
As redes abertas estão em perigo. A queda da audiência parecia contida e às vezes até revertida, mas as quatro grandes redes, no último inverno, tiveram uma queda de audiência de 17% na faixa dos 18 aos 49 anos, a mais importante para os anunciantes. Foi a maior na história.
A CBS foi a que menos perdeu na nobre faixa etária, mas está num ar um novo perigo: o Aereo. Com suas antenas, captura os sinais das redes abertas e os joga na internet.
A CBS reagiu com processo porque Aereo cobra pelo serviço, mas, por enquanto, perde nos tribunais. Uma opção dos canais abertas é tirar o sinal do ar e transmitir por cabo e satélite. O impensável está nas mesas.
Muitos shows e programas das redes hoje mendigam por 5 milhões de telespectadores. Nos 60 e 70, shows semanais davam audiências de 50 milhões. Anunciantes correm para a TV por assinatura, onde algumas séries ja passam dos 7 milhões.
Quando fez 80 anos, mesmo sem sintomas de fraquezas e outros problemas associados a válvulas esclerosadas, Barbara Walters trocou a podre por uma nova. Vai cheirar muitas rosas e poderá mandar coroas delas para o enterro das redes.
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