Valor Econômico - 13/03
O comunicado da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) envelheceu em menos de dois dias. No documento, os diretores do Banco Central (BC) sinalizaram que só elevarão a taxa básica de juros (Selic), se o fizerem, a partir de maio. Os participantes do mercado acreditam que o aumento da Selic virá já em abril.
O Comitê condicionou a decisão sobre juros à análise da atividade econômica e da inflação até seu próximo encontro. Na prática, introduziu incerteza. Como na sexta-feira o IBGE divulgou que o IPCA de fevereiro ficou em 0,60%, acima das estimativas dos agentes econômicos e do presidente do BC, Alexandre Tombini, que previra 0,43% - metade do resultado de janeiro -, o mercado concluiu que a piora sensível do quadro inflacionário levará o Copom a agir logo.
O BC tem enfrentado grande dificuldade para convencer o governo de que precisa subir a Selic. Em tese, o juro deve ser aumentado em duas situações: quando a economia cresce acima das possibilidades e/ou quando as expectativas de inflação superam a meta de 4,5%.
Como se sabe, desde 2011 o PIB brasileiro vem se expandindo abaixo do potencial. Já as expectativas para o IPCA estão, desde o segundo semestre de 2010, persistentemente acima da meta. Apesar disso, há no mercado a crença de que, depois de acelerar no curtíssimo prazo, o índice acumulado em 12 meses recuará, embora vá continuar superior à meta.
O BC teme a deterioração das expectativas. Não é para menos. A mediana dos participantes da pesquisa Focus está prevendo inflação de 5,82% neste ano e de 5,5% em 2014. A mediana das cinco instituições que mais acertam previsões antevê, respectivamente, 5,73% e 6%.
Integrantes do BC consideram que, se essas expectativas não começarem a melhorar desde já, será mais difícil o IPCA recuar adiante. Aumentar a Selic agora seria a melhor forma de mostrar que o BC está no controle da situação. O problema é que persuadir o Palácio do Planalto de que o momento atual, marcado por baixo crescimento e pouca disposição dos empresários para investir, exige a alta dos juros é uma tarefa penosa. Em Brasília, é baixíssimo o prestígio do regime de metas para inflação, no qual a coordenação de expectativas desempenha papel central.
O vaivém da comunicação do BC mostra que a instituição está sob forte pressão. Tem sido assim desde o início do governo Dilma, mas nas últimas semanas é algo que chegou ao paroxismo.
Quando o IBGE divulgou o IPCA de janeiro, o presidente do BC manifestou desconforto e sinalizou mudança da política adotada em outubro. Por essa estratégia, a Selic ficaria estável por período prolongado. Em contatos com o mercado, diretores deram a entender que se aproximava o momento de normalizar a política monetária.
Na gestão Dilma, expectativas nunca ficaram ancoradas
Alguns dias depois, em entrevista ao "Wall Street Journal", Tombini elevou o tom ao afirmar que a prioridade do BC é combater a inflação, em vez de estimular o crescimento. Chegou a usar a expressão "monitorar os desdobramentos atentamente", adotada pelo Copom em momentos que antecedem elevações de juros.
Curiosamente, à repercussão no mercado desses discursos austeros tem se seguido, não raro, sinalização na direção contrária. A ideia é convencer formadores de opinião e o próprio mercado de que Tombini foi mal interpretado. Essa ambiguidade acabou marcando o último encontro do Copom.
Isso indica que o Comitê foi pressionado a adiar para maio decisão que planejava tomar antes disso. O governo quer que o BC só pense em mexer nos juros depois de conhecer o resultado do PIB no primeiro trimestre - e o número, vejam só, será divulgado em 29 de maio, dia de decisão do Copom - e o IPCA acumulado em 12 meses até abril (uma vez que há expectativa de queda em relação a março).
Tanta pressão sobre o BC tem produzido mais inflação. Nas ruas, é difícil encontrar quem acredite na autonomia da instituição sob Dilma. A própria presidente não tem revelado a menor preocupação em provar o contrário. O resultado são expectativas de inflação desancoradas desde o início do governo, justamente o contrário do que prevaleceu na maior parte da gestão Lula.
Uma análise detida das séries histórias do Boletim Focus mostra que as expectativas de curto prazo se deterioram quando a inflação corrente sobe por qualquer razão - o manual ensina que, se há um choque de demanda, o BC atua para conter o consumo; se o choque é de oferta, combate os chamados efeitos secundários.
A desancoragem ocorre quando a inflação corrente sobe e as expectativas inflacionárias de curto, médio e longo prazos pioram. Diante de choques exógenos, algo bastante comum, se o mercado entende que o BC está no controle e agirá para enfrentar seus efeitos, a inflação de médio e longo prazos fica comportada, o que na prática permite ao Copom recorrer a um ciclo de aperto monetário menor para lidar com o problema.
De 2011 para cá, as expectativas têm piorado mesmo quando a inflação corrente cai. Não há confiança no governo.
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