O GLOBO - 28/03
A História registra os fatos e acontecimentos em que o Brasil, por romper contratos, esquecer as leis e abusar dos "jeitinhos" acaba se saindo mal, cultuando o falso e as maracutaias.
Os episódios se sucedem. Mas pegou mesmo a frase atribuída erradamente ao general Charles de Gaulle, presidente da França: "Le Brésil n"est pas un pays serieux" ("O Brasil não é um país sério"). Até este erro histórico comprova o quanto subvertemos os fatos e as regras no esforço de agradar a todos, mesmo que seja decretando o óbito da verdade e da lei.
Quem cunhou a célebre frase foi o embaixador brasileiro na França em 1962, Carlos Alves de Souza e Filho, em conversa com De Gaulle. Genro do ex-presidente Artur Bernardes, o diplomata se esforçava pata evitar que a pesca de lagosta por embarcações francesas na costa brasileira se transformasse numa verdadeira batalha entre o Brasil, governado por João Goulart, e a França do general.
O caso deu em nada, mas acabou conhecido por Guerra da Lagosta, embora nenhum tiro tenha sido disparado.
O embaixador Alves de Souza, observa o jornalista Antônio Ribeiro, repôs a autoria da frase em seu livro "Um embaixador em tempos de crise" (Livraria Francisco Alves Editora, 1979) e lembrou: "A História está cheia desses equívocos."
No Brasil, desacertos assim proliferam a tal ponto que faz sucesso no Facebook o endereço "Brasil, o país da gambiarra". As gambiarras, aliás, imperam por aqui, como os "gatos" que infestam comunidades carentes, instituindo o furto a céu aberto e às claras de energia, com o risco de curto-circuito e incêndios.
E, especialmente, encontram espaço para crescer e prosperar no Congresso. A sessão em que deputados e senadores votaram a derrubada do veto da presidente Dilma Rousseff à "Lei dos Royalties" revela não apenas a força da maioria, que sempre deve ser respeitada, mas a prevalência de interesses políticos regionais sobre pilares básicos da Constituição, afetando a imagem do país mundo afora e atualizando a frase do embaixador que a História espalhou na voz de De Gaulle.
Sem entrar no mérito de outros vícios de natureza constitucional, fica a mensagem preocupante do Parlamento: dá para acreditar em um país que não honra compromissos previamente acertados?
A Ministra Cármen Lúcia, ao conceder liminar na Ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Governo do Rio, recolocou a questão no trilho traçado pela Constituição de 1988.
Assegurou os direitos dos Estados produtores. Pelo menos até o julgamento do mérito pelo plenário do Supremo Tribunal Federal. E, se o pacto federativo prevalecer, com a confirmação da decisão da ministra, ficarão inalteradas as regras de distribuição dos royalties e participações especiais devidos pela exploração do petróleo.
O Brasil, então, se firmará como um país confiável e sério.
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