FOLHA DE SP - 21/03
Após fim de 14º e 15º salários, Câmara acerta ao limitar horas extras, mas já recria gastos com cotas de deputados e cargos para PSD
Foram evasivas as respostas que deram o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e o deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) ao falar sobre o destino que dariam às verbas economizadas com o elogiável fim do 14º e 15º salários de parlamentares, medida aprovada no final de fevereiro.
"Espero que essas economias todas possam ser direcionadas para o fortalecimento da atividade do Senado", disse o presidente dessa Casa. "Não sei. Boa pergunta", afirmou o presidente da Câmara, como se não fosse significativa uma poupança estimada em cerca de R$ 80 milhões a cada legislatura.
Não faltaram, à época, comentários céticos diante da rara demonstração de austeridade. Menos de um mês depois, a desconfiança prova-se justificada: a Câmara já prepara outras despesas, com a criação de mais cargos comissionados e a ampliação da cota de gastos de cada parlamentar.
Desnecessário dizer que tais iniciativas resultarão em aumento de custos para a Câmara. No caso das cotas (verbas para passagens aéreas, contas telefônicas e combustível, entre outras), o reajuste deve acompanhar a inflação dos últimos dois anos, com impacto anual previsto em R$ 23 milhões.
Nunca é demais lembrar que o congressista brasileiro já é o segundo mais caro do mundo. Além das cotas parlamentares (que oscilam em torno de R$ 30 mil, a depender do Estado de origem do político), cada deputado recebe R$ 78 mil para contratar assessores, salário de R$ 26,7 mil e auxílio-moradia de R$ 3.000 -que também será reajustado.
A criação de cargos implicará custos menos suntuosos, mas nem por isso a iniciativa se torna mais palatável. Ao contrário, ela demonstra com eloquência como funciona a lógica tortuosa dos parlamentares brasileiros.
O que se pretende com o ato nada mais é que abrigar apaniguados do PSD. Como a sigla foi criada pelo ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab depois das últimas eleições, o partido não participou, originalmente, da partilha de cargos -distribuídos de acordo com o tamanho da bancada eleita. Ou seja, em vez de redividir as vagas, a Mesa Diretora julgou ser mais conveniente abrir novos espaços.
A Câmara também anunciou medidas para diminuir despesas com horas extras de servidores. Iniciativa louvável, mas insuficiente para compensar a majoração de gastos.
Após seguidos escândalos, seria rematada ingenuidade supor que a Mesa age de boa-fé. Seus ocupantes sabem melhor que ninguém o que estão fazendo: tiram um tanto com uma mão, para simular moderação perante a opinião pública, e recriam gastos com a outra.
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