O ESTADO DE S. PAULO - 19/03
A presidente Dilma Rousseff quis dar um lustre de alta política na eleitoreira troca de três ministros efetuada na última sexta-feira e impropriamente comparada a uma reforma ministerial em seus primeiros passos. Na manhã seguinte, ao dar posse aos novos titulares da Agricultura, Antônio Andrade; Trabalho, Manoel Dias; e Secretaria da Aviação Civil, Wellington Moreira Franco, tentou transformar em virtuoso instrumento de gestão do Estado o que não passa de uma contingência de que os partidos não têm como escapar nos países cujo sistema político-eleitoral praticamente impõe a formação de parcerias de governo. O modelo brasileiro, chamado "presidencialismo de coalizão", é um clássico do gênero.
As vezes, mesmo em configurações construídas para dar à legenda vencedora nas urnas a maioria que lhe permita monopolizar o poder, vez por outra o arranjo não funciona. Desde 2010, por exemplo, o Reino Unido é governado por uma aliança entre os conservadores e os liberais-democratas, porque os primeiros, embora tendo suplantado os eternos rivais trabalhistas, não receberam votos suficientes para dominar sozinhos o Parlamento. Em defesa do argumento de que "a capacidade de estruturar coalizões é crucial para um país com essa diversidade", a presidente citou a Itália e os EUA como exemplos de "deterioração da governabilidade" em razão da falta de discernimento dos políticos em confronto.
No caso italiano, porém, como se viu há pouco, as coalizões, deterioradas pela venalidade dos seus membros e por negociatas de bastidores com as oposições de turno, é que foram repudiadas pelo eleitorado. Um em cada quatro eleitores transformou o Movimento Cinco Estrelas, do comediante Beppe Grillo, na legenda mais votada no país, impedindo a formação de um novo governo. Já no sistema bipartidário dos EUA, ao contrário do que Dilma parece pensar, não há lugar para governos de duas cores. O que havia, antes de os republicanos desfigurarem a política na sua guerra de extermínio contra os democratas, eram acordos pontuais entre "os dois lados do corredor" do Congresso, diante de matérias de primeira necessidade nacional.
A prioridade da presidente, como se sabe, é outra: preservar para a sucessão de 2014 a ampla aliança fisiológica que o seu patrono Luiz Inácio Lula da Silva costurou em seu favor, até mesmo ampliando a que o circundou - sabe-se a troco do que - nos seus oito anos de Planalto. A tal da "governabilidade" pode ser comparada à proverbial imagem da santa nas alcovas da noite. É invocada numa tosca tentativa de dar fumaças de decência às nuas ambições dos políticos e disfarçar a aquiescência mercenária da presidente em satisfazê-las. Nada além disso está por trás da remoção de um competente técnico apartidário da cada vez mais importante Secretaria de Aviação Civil, Wagner Bittencourt, para a entrega do seu lugar ao veterano político peemedebista Moreira Franco, até então encostado na Secretaria de Assuntos Estratégicos - cujos recursos, dizia ele, não dão para eleger nem um vereador.
Pior ainda, agora do ponto de vista moral, foi a devolução do Ministério do Trabalho ao núcleo dominante do PDT, liderado pelo mesmo Carlos Lupi que perdeu a pasta por denúncias de corrupção, na sétima faxina do primeiro ano da gestão da petista ex-pedetista. O ministro defenestrado, Brizola Neto, não caiu por ser ainda menos capaz ou íntegro que o antecessor, mas por ser seu desafeto. Restabelecida a boa vizinhança entre o Planalto e o partido, Dilma espera que Lupi pare de flertar com o PSB do governador pernambucano e candidato presidencial quase certo, Eduardo Campos. Na Agricultura, por fim, a saída do deputado Mendes Ribeiro, do PMDB gaúcho, era inevitável, dada a sua saúde precária.
Paia a vaga foi outro correligionário mais bem posto no jogo da sucessão. Antônio Andrade dirige o partido em Minas Gerais, Estado do presidenciável tucano Aécio Neves, por sinal não de todo desprovido de simpatizantes no PMDB local. Com a nomeação de Andrade, a presidente chega à sintonia fina da fisiologia em nome da "governabilidade".
As vezes, mesmo em configurações construídas para dar à legenda vencedora nas urnas a maioria que lhe permita monopolizar o poder, vez por outra o arranjo não funciona. Desde 2010, por exemplo, o Reino Unido é governado por uma aliança entre os conservadores e os liberais-democratas, porque os primeiros, embora tendo suplantado os eternos rivais trabalhistas, não receberam votos suficientes para dominar sozinhos o Parlamento. Em defesa do argumento de que "a capacidade de estruturar coalizões é crucial para um país com essa diversidade", a presidente citou a Itália e os EUA como exemplos de "deterioração da governabilidade" em razão da falta de discernimento dos políticos em confronto.
No caso italiano, porém, como se viu há pouco, as coalizões, deterioradas pela venalidade dos seus membros e por negociatas de bastidores com as oposições de turno, é que foram repudiadas pelo eleitorado. Um em cada quatro eleitores transformou o Movimento Cinco Estrelas, do comediante Beppe Grillo, na legenda mais votada no país, impedindo a formação de um novo governo. Já no sistema bipartidário dos EUA, ao contrário do que Dilma parece pensar, não há lugar para governos de duas cores. O que havia, antes de os republicanos desfigurarem a política na sua guerra de extermínio contra os democratas, eram acordos pontuais entre "os dois lados do corredor" do Congresso, diante de matérias de primeira necessidade nacional.
A prioridade da presidente, como se sabe, é outra: preservar para a sucessão de 2014 a ampla aliança fisiológica que o seu patrono Luiz Inácio Lula da Silva costurou em seu favor, até mesmo ampliando a que o circundou - sabe-se a troco do que - nos seus oito anos de Planalto. A tal da "governabilidade" pode ser comparada à proverbial imagem da santa nas alcovas da noite. É invocada numa tosca tentativa de dar fumaças de decência às nuas ambições dos políticos e disfarçar a aquiescência mercenária da presidente em satisfazê-las. Nada além disso está por trás da remoção de um competente técnico apartidário da cada vez mais importante Secretaria de Aviação Civil, Wagner Bittencourt, para a entrega do seu lugar ao veterano político peemedebista Moreira Franco, até então encostado na Secretaria de Assuntos Estratégicos - cujos recursos, dizia ele, não dão para eleger nem um vereador.
Pior ainda, agora do ponto de vista moral, foi a devolução do Ministério do Trabalho ao núcleo dominante do PDT, liderado pelo mesmo Carlos Lupi que perdeu a pasta por denúncias de corrupção, na sétima faxina do primeiro ano da gestão da petista ex-pedetista. O ministro defenestrado, Brizola Neto, não caiu por ser ainda menos capaz ou íntegro que o antecessor, mas por ser seu desafeto. Restabelecida a boa vizinhança entre o Planalto e o partido, Dilma espera que Lupi pare de flertar com o PSB do governador pernambucano e candidato presidencial quase certo, Eduardo Campos. Na Agricultura, por fim, a saída do deputado Mendes Ribeiro, do PMDB gaúcho, era inevitável, dada a sua saúde precária.
Paia a vaga foi outro correligionário mais bem posto no jogo da sucessão. Antônio Andrade dirige o partido em Minas Gerais, Estado do presidenciável tucano Aécio Neves, por sinal não de todo desprovido de simpatizantes no PMDB local. Com a nomeação de Andrade, a presidente chega à sintonia fina da fisiologia em nome da "governabilidade".
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