O GLOBO - 05/03
O fato de quase a metade dos assentados depender de ajuda assistencial do Estado é sugestivo. O governo acerta, portanto, ao reduzir a distribuição de lotes
Ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho é uma espécie de setorista de “movimentos sociais”. E pela longa militância no PT nesta área, Carvalho tem credibilidade para analisar de forma crítica a reforma agrária, uma das mais caras bandeiras da esquerda brasileira, desfraldada até mesmo pelos governos militares. Diante de críticas ao relativamente baixo número de assentados nos dois anos de governo Dilma, o ministro justificou o freio com a afirmação de que muitos assentamentos estão virando “quase que favelas rurais”.
Tem razão o ministro. E faz todo o sentido Dilma reduzir o ritmo de criação de assentamentos. Os números oficiais refletem a desaceleração: a média anual de famílias assentadas por FH foi de 67.588; Lula, 76.761, e Dilma, apenas 22.552. Desabaram críticas de políticos do PT e militantes sem-terra, por óbvio, sobre Gilberto Carvalho. Afinal, reforma agrária gera votos e cifrões. Porém, repórteres do GLOBO visitaram assentamentos em São Paulo e Pernambuco, estados em posições diferentes em termos de estágio de desenvolvimento, e confirmaram a conclusão do ministro.
A favelização de assentamentos é denunciada nas estatísticas. Por exemplo, pelo dado de que 36% das 945.405 famílias assentadas (ou 339.945)sobrevivem do Bolsa Família, por terem renda abaixo do limite divisor da miséria. Se forem consideradas famílias assentadas inscritas no Ministério de Desenvolvimento Social para receberem algum tipo de benefício assistencial, o número sobe para 466.218, ou 49% do total.
Não se realizou o sonho da redenção social por meio da divisão de terras. Foram distribuídos 87 milhões de hectares, 10,8% do território nacional, e, mesmo assim, metade dos assentados não sobrevive sem a ajuda assistencialista do Estado.
O abandono do assentado, nem sempre vocacionado ao trabalho no campo, é parte da explicação. Há, ainda, problemas de qualidade da terra, bem como de infraestrutura (estradas, água, energia elétrica). Pesquisa do próprio Ministério do Desenvolvimento Agrário encontrou elevados índices de reclamação quanto a estes pontos nos assentamentos visitados. Sem apoio de extensão rural, tudo fica ainda mais difícil. Diante deste quadro, o governo age de maneira sensata ao dar prioridade à tentativa de corrigir os assentamentos existentes em vez de instalar outros. Não atende aos interesses políticos do MST e aliados, mas ao bom senso e a critérios mínimos de seriedade no emprego do dinheiro do contribuinte.
Espera-se que, num segundo momento, o governo se convença de que a modernização da agricultura e a própria urbanização do país jogaram na lata de lixo da História a reforma agrária, tema de meados do século passado, de um Brasil muito diferente do de hoje. Mesmo o MST enfrenta dificuldades de recrutar adeptos que saibam cultivar a terra. Até a nova geração nascida em assentamentos migra para as cidades.
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