Mais do que simplesmente usar outra vez de maneira inescrupulosa os mecanismos da contabilidade criativa - de que vem lançando mão com frequência cada vez maior para tentar encobrir sua inapetência política para limitar seus gastos às receitas que legitimamente tem auferido -, o que o governo do PT fez para anunciar a redução das tarifas de energia elétrica foi enganar o consumidor e comprometer programas de administrações futuras.
Por meio de complexa manobra contábil-financeira, legal, mas ardilosa, o subsídio implícito na redução tarifária - estimado em R$ 8,46 bilhões em 2013 e em valor semelhante em 2014 - não será fornecido diretamente pelo Tesouro Nacional, o que deixa a impressão enganosa de que não terá custos fiscais, mas implicará o comprometimento antecipado de receitas futuras. Os benefícios que a presidente Dilma Rousseff oferece no presente, para alcançar popularidade que lhe assegure boa posição na disputa eleitoral de 2014, somente serão pagos depois que ela deixar o poder - mesmo que seja reeleita.
Ninguém é contra a redução das tarifas de energia elétrica. Mas, para alcançar esse objetivo, o governo agiu atabalhoadamente e impôs ao setor um programa de renovação de concessões que implicou a redução compulsória das tarifas. Dadas as exigência econômico-financeiras implícitas nas regras para renovar suas concessões, que vencem a partir de 2015, empresas controladas por governos estaduais desistiram da renovação.
Sem a participação dessas empresas, não seria alcançada a redução tarifária média de 16,2% para consumidores residenciais e de até 28% para a indústria nas condições anunciadas pela presidente em setembro do ano passado, quando se conheceram as normas para a renovação das concessões que vencem nos próximos anos. Com as empresas estaduais, a parte da redução tarifária que caberia ao Tesouro foi estimada em R$ 3,3 bilhões.
A política energética do governo vem sendo severamente criticada, por causa da frequência dos apagões. O atraso na definição de grandes obras de geração hidrelétrica, o descompasso entre essas obras, quando executadas, e as de transmissão de energia - que gera situações absurdas como a de uma usina entrar em operação e não poder despachar a energia gerada porque as obras dos linhões estão atrasadas - e, em consequência, o maior uso da geração termoelétrica para compensar a perda de capacidade das hidrelétricas em razão do baixo nível de suas represas igualmente alimentaram as críticas.
Trata-se de um setor pelo qual a presidente tem interesse especial, pois, antes de chefiar a Casa Civil, foi ministra de Minas e Energia na gestão Lula.
Em resposta às críticas cada vez mais fortes, e estimuladas pela redução da capacidade das hidrelétricas em razão da estiagem do ano passado e pelas dificuldades para o cumprimento da promessa de redução de tarifas, a presidente anunciou, num rompante característico de seu modo de agir quando irritada, redução ainda maior do que a prometida, mesmo em condições mais difíceis. A queda será de 18% para as residências e de até 32% para as indústrias.
Como tem feito com o superávit primário, também neste caso o governo Dilma utilizou manobras contábeis. A Itaipu Binacional tem uma dívida com a União, contraída para a construção da usina. Essa dívida vem sendo paga em parcelas anuais, de cerca de R$ 4 bilhões, e vence em 2023. O que o governo fez foi antecipar o pagamento de parcelas, por meio da venda desses créditos ao BNDES. O dinheiro recebido é transferido para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que subsidia a tarifa.
Trata-se de uma antecipação de receitas. Na década de 1990, esse tipo de operação levou à quebra dos bancos estaduais, entre os quais o Banespa, e à desorganização das finanças dos Estados, só recompostas por meio de ampla renegociação de suas dívidas e, posteriormente, pela edição da Lei de Responsabilidade Fiscal. Imaginava-se que essa prática não mais fizesse parte do arsenal de espertezas dos gestores de dinheiro público.
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