FOLHA DE SP - 17/02
SÃO PAULO - Segundo o Conselho de Medicina Veterinária de São Paulo, o Estado já conta com 50 creches para cachorro. Elas recebem animais cujos donos passam boa parte do dia fora de casa e lhes oferecem recreação, que pode incluir atividades como natação e musicoterapia. Os cães levam até suas lancheirinhas, o que dá uma nova dimensão ao termo antropomorfização, a tendência de atribuir características humanas ao que não o é.
A noção, criada pelos gregos, já surgiu como advertência. Xenófanes se insurge contra Homero por tratar Zeus como humano, atitude que julgava arrogante. Os deuses olímpicos se foram, mas a ideia de que não devemos antropomorfizar ficou, migrando da teologia para a ciência.
Quem com mais força pregou contra a antropomorfização foram os behavioristas, liderados por B.F. Skinner, para os quais, em nome da parcimônia explicativa, toda forma de introspecção deveria ser banida da pesquisa científica. Essa posição encontrou seguidores mesmo entre alguns biólogos evolucionistas, para os quais ou as coisas se explicam em termos de genes ou não se explicam.
Em tempos modernos, coube a primatologistas como Frans de Waal questionar o dogma. Não é uma coincidência. Eles trabalham com nossos parentes mais próximos que, não por acaso, são os que exibem atitudes mais parecidas com as nossas. E, se descendemos todos de um ancestral comum relativamente recente e possuímos mais ou menos a mesma química cerebral, por que não podemos ter os mesmos sentimentos?
É claro que precisamos de cuidado para não atribuir a um cachorro emoções extremamente intelectualizadas como amor romântico ou êxtase religioso, mas, como observa De Waal, se não enxergarmos as semelhanças entre os animais e nós, corremos o risco de deixar escapar algo fundamental, sobre eles e sobre nós.
Lembre-se disso da próxima vez que esquecer a lancheira do seu cão.
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