sábado, janeiro 12, 2013

Receita para o caos - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 12/01


O risco de racionamento de energia evidencia as falhas do governo federal no setor elétrico, mas elas são acentuadas pela insistência em ignorar os problemas


Agora é impossível colocar a culpa na “herança maldita”. O célebre apagão de 2001 ajudou o PT a tirar o PSDB da presidência da República no ano seguinte, mas, após dez anos de governo petista, o Brasil volta a viver a ameaça de racionamento, ironia ainda maior quando se considera que a atual presidente foi a ministra de Minas e Energia nos primeiros dois anos e meio da era Lula. Os problemas da geração e transmissão de energia no país não são algo que se possa resolver da noite para o dia, mas dez anos são tempo suficiente para uma mudança de rumo no setor – mudança essa que foi pífia demais na comparação com as exigências trazidas pelo crescimento do país.

Reportagem da Gazeta do Povo publicada na última quarta-feira mostrou que, enquanto o consumo de eletricidade no país cresceu 60% entre 2002 e 2011, a capacidade brasileira de armazenar energia gerada por usinas hidrelétricas cresceu apenas 20%, segundo dados da Empresa de Pesquisa Energética, do governo federal. Um dos fatores que explica essa discrepância é a preferência dada às usinas chamadas “a fio d’água”, que não têm grandes reservatórios e por isso inundam áreas menores, com menor impacto ambiental – item do qual movimentos ambientalistas não abrem mão. Mas, sem a capacidade de armazenar água para momentos de estiagem como o atual, elas dependem da generosidade constante de São Pedro para seguir gerando energia. As grandes e polêmicas usinas de Belo Monte, Jirau e Santo Antônio também são a fio d’água. E, mesmo quando a energia é suficiente, há poucas linhas de transmissão que permitam uma distribuição inteligente do potencial gerado. Sem o Linhão do Madeira (previsto para começar a operar neste ano), por exemplo, a energia gerada por Santo Antônio não se integra à rede nacional, ficando restrita à Região Norte.

Com a capacidade de geração das hidrelétricas prejudicada, o governo se vê obrigado a ligar as termelétricas movidas a gás, óleo ou carvão – esse, sim, um ponto em que o governo agiu de forma mais efetiva nos últimos dez anos, já que o parque termelétrico foi quadruplicado desde 2001. No entanto, a energia de origem termelétrica é mais poluente e mais cara – e quase todas as usinas térmicas do país estão ligadas justamente no momento em que o governo trava uma queda de braço com empresas de energia para reduzir a tarifa. O custo do acionamento das termelétricas será repassado ao consumidor, adiantou o ministro Edison Lobão na segunda-feira. E a Petrobras, que já paga o preço de escolhas populistas do governo no setor de combustíveis, aumenta o seu prejuízo ao ter de importar gás natural para abastecer as usinas.

As termelétricas, no entanto, por seu preço e impacto ambiental, não podem ser o “plano B” do país indefinidamente. Mas o uso de energias alternativas ainda engatinha no país. A energia eólica até está crescendo: segundo dados do Operador Nacional do Sistema, em dezembro de 2012 a energia gerada pelo parque eólico brasileiro foi quase nove vezes maior que no mesmo mês de 2006. Mesmo assim, ela responde por apenas 1,6% da matriz energética brasileira. Em fevereiro de 2011, a Gazeta do Povo já mostrava como o Paraná desperdiça um potencial eólico de 3,4 mil megawatts, que seriam suficientes para abastecer quase toda a população do estado se as torres funcionassem o tempo todo na velocidade máxima (o que, no entanto, não acontece). O aproveitamento da energia solar se encontra em estado ainda mais deprimente: apenas 0,01% da matriz energética brasileira vem de painéis solares.

O risco de racionamento evidencia as falhas no planejamento e nos investimentos do governo federal no setor, mas elas são acentuadas pela insistência em convencer a população de que a situação está sob controle, preocupando-se mais com o palavreado – Dilma tem horror a “apagão”, preferindo “blecaute”, e afirmou que era “ridículo” falar em racionamento, mas dias depois teve de convocar uma reunião de emergência para discutir a crise – que com o diagnóstico correto do problema. Manter na pasta de Minas e Energia um político cujo único mérito é ser apadrinhado de José Sarney também colabora para o caos. Só deixando de agir como avestruz o governo poderá preparar o país de forma adequada para enfrentar futuras estiagens e gerar a energia necessária para o momento em que o país retomar o crescimento.

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