FOLHA DE SP - 12/01
O burocrata complica o caminho da solução rápida, fere a eficiência e perturba a estabilidade do bom direito
A burocracia é vista, hoje, como realidade operativa entre dois extremos. São os efeitos positivos de sua aplicação, segundo técnicas aperfeiçoadas no século 20, e os negativos, nascidos dela quando, digamos assim, se burocratizou, gerando uma das pragas da vida moderna, na complexidade excessiva das estruturas.
Lembrei-me desse choque contrastante ao ler texto de palestra do ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), proferida em seminário com a Faculdade de Administração Pública de Nordrhein-Westfallen, na Alemanha, publicada pela FGV (projeto nº 15).
Mendes cuida da melhor gestão do Poder Judiciário, a ser aprimorada no Brasil. Anota, com propriedade histórica, o fato relevante, tanto quanto inusitado, de estarmos próximos de um quarto de século sob governos democráticos, para a livre discussão dos nossos problemas e suas soluções.
Entre eles, o ministro do STF inclui a "melhoria constante dos serviços públicos", a ser garantida, entre muitos pontos, pela "autonomia administrativa e financeira do Judiciário". Autonomia compatível com a carga imposta à magistratura nacional: 2,5 milhões de processos nos juizados especiais (os mais recentes da estrutura judicial), 30 milhões de questões exclusivamente tributárias. Lembra, na área penal, as más condições dos presídios, o absurdo em prisões ditas "provisórias". Saúda avanços da eficiência, gerados pelo Conselho Nacional de Justiça, apesar das resistências opostas à correção dos defeitos.
Na mesma publicação, Flávio Vasconcelos, diretor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da FGV (Ebape/FGV), destaca formatos organizacionais e sua evolução. Entende que a atividade judicial eficiente se submete à independência do juiz e à equidade no processo. Deve superar a complexidade dos elementos processuais, para vencer "o desafio de criar um novo modelo de gestão".
Defende ainda "uma administração de perfil gerencial", com "metas específicas para julgamentos em relação a cada tribunal". Invoca a divulgação do resultado anual de cada tribunal, para comparações não distorcidas, de seus níveis de produtividade.
No dia a dia da vida outro dado se impõe. É a velocidade da transformação planetária dos comportamentos dos grupos e dos indivíduos, com as variedades de novas formas, em tempo muito curto. Nesse quadro, o profissional do direito vive o drama da Constituição muito emendada, das centenas de leis publicadas nos três níveis de governo, seguidas por milhões (milhões, veja bem o leitor) de termos nos regulamentos burocráticos.
O ministro Gilmar Mendes, ao apresentar as palestras transcritas na publicação, disse que o intuito de "atender aos ditames da ordem constitucional vigente", mostra a importância da discussão livre, a envolver "soluções viáveis para os complexos desafios" que o Brasil e, em especial, o Judiciário, vem enfrentando. Para mesclar burocracia e eficiência assinala a importância da cooperação germânico-brasileira, que marcou o encontro.
Não se esqueça, porém, que o burocrata, por vezes complica o caminho da solução rápida, desejada pelo bom administrador. Fere a eficiência imprescindível e perturba a estabilidade do bom direito. É dilema a ser resolvido.
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