FOLHA DE SP - 15/01
Nós, cidadãos, que votamos para os parlamentares decidirem, frustramo-nos, pois quem acaba por decidir é o poder econômico
O Poder Executivo Federal, hipertrofiado, é tão poderoso que a) na sua função típica, administra a sociedade; b) mas também legisla, pois participa do processo legislativo, com o poder de sanção e veto; c) expede -e como!- medidas provisórias; d) em extenso rol de temas relevantíssimos, só ele, Executivo, detém a competência privativa para legislar, impedindo o Legislativo de fazê-lo; e) executa o Orçamento, fonte de barganhas; f) dispõe de milhares de cargos em comissão, outra fonte de barganhas; g) faz o Congresso Nacional deglutir os projetos de lei de interesse dele, Executivo.
E o Legislativo se submete, obediente, às injunções do Executivo e deixa de representar os interesses da massa popular. Os partidos políticos, que dariam voz ao povo, preocupam-se com seus próprios interesses. E nós, cidadãos, que votamos para deputado federal e senador, visando a que o Congresso Nacional decida, frustramo-nos, pois ele não decide. E quem acaba por decidir, é o Banco Mundial ou o FMI ou o mercado, este deus selvagem que despreza a ética e o afeto.
Em suma, é o poder econômico (que manda no mundo) quem decide, e eis a suma ironia: votamos, para que o Congresso decida. Mas este não decide. Quem decide não foi por nós votado! Do que se infere que o cidadão esta cada vez mais distante do núcleo político das decisões, sem que o perceba, iludido por um sistema de dominação que dissimula o poder e explora seus semelhantes.
Como o Congresso não decide, e como chegam ao Judiciário processos sobre delicados temas, como o das relações homoafetivas e o do aborto, o Supremo Tribunal Federal (STF) não fugiu de sua responsabilidade, mas foi acusado de invasão da esfera legislativa. Ocorre que os ministros foram eleitos de forma indireta pelo povo: sua nomeação decorre de ato conjunto do Executivo e do Legislativo.
Entrementes, o STF julgou o mensalão, e vimos que os ministros se empenharam em julgar com justiça, como de seu hábito, razão pela qual merecem veemente repúdio as tentativas de desqualificação desse julgamento, acoimado de "político", esboçando-se, por iniciativa de certos setores políticos, uma reação orquestrada, que despreza a inteligência do povo.
Faça-se justiça: a tais condenações não se poderia chegar, se duas outras instituições não trabalhassem com inteligência e vontade: a Polícia Federal e o Ministério Público Federal (MPF), embora suas tarefas houvessem sido facilitadas pelas declarações de Marcos Valério e de Roberto Jefferson. A Polícia Federal, porém, alinhavou as provas, trouxe-as para o MPF e este as apresentou ao Supremo.
Os magistrados reclamavam da inoperância dos órgãos da investigação e da persecução penal, antes da Constituição Federal de 1988. Para quem conhece o Judiciário, não foi surpresa a decisão condenatória emanada do STF, pois, havendo prova, os magistrados proferem decisões condenatórias, tanto que cumprem pena pessoas de prestígio, sem que o Judiciário tivesse interesse em dar publicidade a tais condenações.
E assim devem continuar os juízes, julgando sem arrogância, mas com humildade, ao passo que a imprensa, outra instituição garantidora da democracia, deverá manter-se comprometida com a verdade, impedindo a publicação de meias verdades ou inteiras mentiras, para que, no conjunto, as instituições tornem a sociedade menos infeliz...
Nenhum comentário:
Postar um comentário