O ESTADÃO - 10/06
Breno resistiu um pouco quando a professora Matilde o convidou para ser modelo na sua escola de arte.
– Sei não...
– Você só precisa posar para as moças.
Eram só moças na aula de desenho da professora Matilde.
– Mas... posar nu?
– Claro que nu.
– Sei não...
Breno tinha um corpo atlético, bem estruturado. Um corpo clássico. Até então as alunas da professora Matilde só tinham desenhado vasos, caixas, frutas. Natureza-morta. Estava na hora de começarem a desenhar o corpo humano. Para terem uma noção de proporção e anatomia, que a natureza morta não podia dar.
Breno topou. Afinal era só tirar a roupa, fazer uma pose, ficar parado e depois ser pago. Não havia mal nenhum. Era arte.
– Faça qualquer pose, Breno – instruiu a professora Matilde. – Uma que seja confortável para você.
Breno subiu no estrado que fazia as vezes de um pedestal e, sem querer, fez uma pose parecida com a do Davi do Michelangelo.
– Perfeito – disse a professora Matilde. – Meninas, comecem a desenhar.
Durante alguns minutos, tudo correu bem. Mas aí aconteceu uma coisa que nunca aconteceu com o Davi de Michelangelo. Breno começou a ter uma ereção. A princípio apenas um movimento, quase imperceptível. Em seguida, uma ereção completa, decididamente perceptível.
– Ai meu Deus – disse uma das moças.
Outras riram. Todas pararam de desenhar. O modelo estava se mexendo. Ou uma parte do modelo estava se mexendo. Era mais anatomia do que elas precisavam.
– Breno – disse a professora Matilde. – Assim não vai dar.
– Desculpe – disse Breno. – Eu não consigo controlar. Eu...
– Pense em alguma coisa desestimulante.
– Em quê?
– Qualquer coisa.
A professora Matilde sugeriu que Breno pensasse em água fria. Um choque de água fria. Ou pensasse na sua mãe. O que ela diria daquilo? Mas a ereção não diminuiu.
– Pense em alguma coisa horrível – ordenou a professora Matilde. – A fome na África.
– A situação no Oriente Médio – lembrou uma das moças.
– A crise da dívida na Europa – lembrou outra moça.
– Isso – disse uma terceira. – Pense na Angela Merkel!
A ereção não diminuía. E as sugestões do grupo se multiplicavam. Iam do grotesco ( “Imagine que ele ficou preso num moedor de carne!” ) ao filosófico (“Pense na finitude humana!”).
Quem entrasse na sala naquela hora não entenderia a cena. Um homem nu, visivelmente constrangido, cercado por mulheres que gritavam.
– Pense em injeção!
– Um fora da namorada!
– Um meteoro se chocando com a Terra!
– O Bashar al-Assad!
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