domingo, junho 10, 2012
Dilema caolho - SUELY CALDAS
O Estado de S.Paulo - 10/06
"O consumo tem que ser cuidado. O investimento vem a reboque", afirmou o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, na terça-feira, no Congresso. É o caolho dilema que se discute hoje: o consumo é precondição para ativar o investimento ou é o investimento que acelera o consumo? Qual dos dois determina o crescimento da economia? Ora, sem os dois não há combustível para a economia crescer, responde o bom senso.
Na crise financeira de 2008 o governo Lula cuidou do consumo e descuidou do investimento. Era a forma mais rápida e fácil de afastar o efeito recessivo da crise e recuperar o crescimento. A queda de 3,6% do PIB do 3.º para o 4.º trimestre de 2008 assustou e o governo decidiu reagir. Todos os dias Lula aconselhava os brasileiros a se endividarem, consumirem, não pararem de comprar. Mas a crise piorou e em 2009 o PIB estagnou, avançou minguados 0,3%. Outro enorme susto, visto que a eleição presidencial se daria no ano seguinte. Aí o governo apelou: distribuiu dinheiro aos bancos públicos, estimulou o crédito, reduziu impostos de automóveis e eletrodomésticos, enfim, despejou muito dinheiro público no consumo. Deu certo: em 2010 o PIB cresceu 7,5% e a candidata de Lula ganhou a eleição.
E o investimento? As obras públicas seguiam lentamente, em ritmo oposto ao avanço da corrupção; e o investidor privado recuou, seja por precaução ao aprofundamento da crise lá fora, seja pela incerteza em relação ao rumo da economia aqui dentro, ou por insegurança nas regras de regulação em projetos de infraestrutura. Apesar disso, em 2011 o emprego e os salários seguiam bem, mas a produção industrial retraiu fortemente, o consumo recuou, o crédito rareou e a inadimplência avançou. O tsunami do consumo começou a fazer marola em ritmo cada vez mais suave e o PIB cresceu só 2,7%. Em 2012 a situação se agravou e, até março, o PIB cresceu raquítico 0,2%, com a agropecuária desabando 7,3% e uma péssima e desalentadora notícia: a taxa de investimento na economia caiu de 19,5% para 18,7%.
Hoje os brasileiros vivem sob expectativa de um duplo dilema: o consumo cai por fadiga de um modelo empurrado por incentivos e, por isso mesmo, de curta duração; e os investimentos não deslancham porque o governo deles descuidou - desaceleraram no setor público, sobretudo aqueles conduzidos pelo Ministério dos Transportes, onde se concentraram os casos de corrupção; e no setor privado persistem os problemas de falta de rumo e de regulação. A boa notícia vem da consequência desse quadro de retração econômica: a inflação caiu mais que o esperado, abrindo espaço para nova queda dos juros. Mas só o futuro dirá se e quando - nas atuais circunstâncias - juros mais baixos reverterão em retomada do crescimento, como deseja a presidente Dilma Rousseff.
Fora a inflação, os sintomas não animam: em comparação com o ano eleitoral de 2010, nos primeiros cinco meses de 2012 o investimento público caiu de R$ 17,7 bilhões para R$ 14,3 bilhões; leilão de transmissão de energia atrai pouco interesse; a Bovespa cai todo dia; em maio o movimento de fuga de dólares carregou para fora do País US$ 5,05 bilhões de operações com ações e fundo de renda fixa; todo mês o IBGE divulga mais uma queda da produção industrial; para não demitir, a indústria automobilística recorre a férias coletivas, descanso temporário de trabalhadores e a General Motors já anunciou um Plano de Demissões Voluntárias; e o faturamento com a venda de máquinas (que sinaliza investimentos) caiu 16,8% em abril, em relação a março. E por aí vai. Já há analistas apostando em crescimento inferior a 2% em 2012.
Tombini tem razão ao dizer que o investimento vem a reboque do consumo. Em geral é isso que ocorre. Mas no caso do Brasil, sustentar o investimento continuado, sem interrupções, depende (e muito) de desfazer entraves da infraestrutura, de um programa de governo bem estruturado para a economia, de regras de regulação estáveis, ação autônoma das agências reguladoras. Enfim, de um rosário de antecedentes que todo mundo enxerga, menos o governo.
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