segunda-feira, junho 04, 2012

Degraus de ilusão - LYA LUFT

REVISTA VEJA


Fala-se muito na ascensão das classes menos favorecidas, formando uma "nova classe média", realizada por degraus que levam a outro patamar social e econômico (cultural, não ouço falar). Em teoria, seria um grande passo para reduzir a catastrófica desigualdade que aqui reina. Porém receio que, do modo como está se realizando, seja uma ilusão que pode acabar em sérios problemas para quem mereceria coisa melhor. Todos desejam uma vida digna para os despossuídos, boa escolaridade para os iletrados, serviços públicos ótimos para a população inteira, isto é, educação, saúde, transporte, energia elétrica, segurança, água, e tudo de que precisam cidadãos decentes.

Porém, o que vejo são multidões consumindo, estimuladas a consumir como se isso constituísse um bem em si e promovesse real crescimento do país. Compramos com os juros mais altos do mundo, pagamos os impostos mais altos do mundo e temos os serviços (saúde, comunicação, energia, transportes e outros) entre os piores do mundo. Mas palavras de ordem nos impelem a comprar, autoridades nos pedem para consumir, somos convocados a adquirir o supérfluo, até o danoso, como botar mais carros em nossas ruas atravancadas ou em nossas péssimas estradas. Além disso, a inadimplência cresce de maneira preocupante, levando famílias que compraram seu carrinho a não ter como pagar a gasolina para tirar seu novo tesouro do pátio no fim de semana. Tesouro esse que logo vão perder, pois há meses não conseguem pagar as prestações, que ainda se estendem por anos.

Estamos enforcados em dívidas impagáveis, mas nos convidam a gastar ainda mais, de maneira impiedosa, até cruel. Em lugar de instruírem, esclarecerem, formarem uma opinião sensata e positiva, tomam novas medidas para que esse consumo insensato continue crescendo – e, como somos alienados e pouco informados, tocamos a comprar.

Sou de uma classe média em que a gente crescia com quatro ensinamentos básicos: ter seu diploma, ter sua casinha, ter sua poupança e trabalhar firme para manter e, quem sabe, expandir isso. Para garantir uma velhice independente de ajuda de filhos ou de estranhos; para deixar aos filhos algo com que pudessem começar a própria vida com dignidade.

Tais ensinamentos parecem abolidos, ultrapassadas a prudência e a cautela, pouco estimulados o desejo de crescimento firme e a construção de uma vida mais segura. Pois tudo é uma construção: a vida pessoal, a profissão, os ganhos, as relações de amor e amizade, a família, a velhice (naturalmente tudo isso sujeito a fatalidades como doença e outras, que ninguém controla). Mas, mesmo em tempos de fatalidade, ter um pouco de economia, ter uma casinha, ter um diploma, ter objetivos certamente ajuda a enfrentar seja o que for. Podemos ser derrotados, mas não estaremos jogados na cova dos leões do destino, totalmente desarmados.

Somos uma sociedade alçada na maré do consumo compulsivo, interessada em "aproveitar a vida", seja o que isso for, e em adquirir mais e mais coisas, mesmo que inúteis, quando deveríamos estar cuidando, com muito afinco e seriedade, de melhores escolas e universidades, tecnologia mais avançada, transportes muito mais eficientes, saúde excelente, e verdadeiro crescimento do país. Mas corremos atrás de tanta conversa vã, não protegidos, mas embaixo de peneiras com grandes furos, que só um cego ou um grande tolo não vê.

A mais forte raiz de tantos dos nossos males é a falta de informação e orientação, isto é, de educação. E o melhor remédio é investir fortemente, abundantemente, decididamente, em educação: impossível repetir isso em demasia. Mas não vejo isso como nossa prioridade. Fosse o contrário, estaríamos atentos aos nossos gastos e aquisições, mais interessados num crescimento real e sensato do que em itens desnecessários em tempos de crise. Isso não é subir de classe social: é saracotear diante de uma perigosa ladeira. Não tenho ilusão de que algo mude, mas deixo aqui meu quase solitário (e antiquado) protesto.

5 comentários:

Anônimo disse...

O estilo de escrita desse texto contradiz o da maioria dos textos da mesma autora. Espero que não aceitem apenas bajulações nesse blog.

Andressa A. disse...

Esse é, na verdade, um texto muito bom. Não tanto do ponto de vista da escrita - já vi muito melhores da escritora, e ela própria admite que é um protesto "antiquado", com argumentos e exposições velhos -, mas do ponto de vista sociológico. (Aliás, foi meu professor de Sociologia que me falou para ler, mas sempre gostei da Lya Luft.)

Ele expõe uma realidade para que poucas pessoas dão atenção, mas de grande gravidade. É algo que pouca gente vê. A maioria das pessoas já está tão alienada que acha que tudo isso que Lya falou é bobagem, coisa de gente "à toa" e sei-lá-mais-o-quê. Mas é importante que aqueles de nós que ainda conseguem ver falem! Porque se todos se calarem, logo não haverá mais ninguém que dará importância para essas coisas, tão óbvias, tão fundamentais, mas tão esquecidas. E aí, meu amigo, aí é que o Brasil já era. Aí é que o Brasil se vê condenado a ser para sempre o país das bobagens.

Calabar Qayin disse...

Concordo com o... Anônimo.
O real autor me é conhecido, mas não tenho o direito de usar sua imagem, uma vez que ele "desistiu" de lutar por esse direito autoral- não há provas.

Unknown disse...

Bom vamos de vista da Lya É bem interessante mas devemos também ver que não é porque estamos jovens que não nos interessamos por certas coisas como o próprio texto fala mas vamos ver que ela está em pondo a sua opinião no texto Então acho que se o argumento foi bem feito pois é mas às vezes estamos esquecendo Qual que é a verdadeira importância de certas coisas

Anônimo disse...

Alguém pode me ajudar oq ele tenta falar com esse texto qual o objetivo a finalidade e ele consegui passar algo ou não pfv e pra um trabalho