FOLHA DE SP - 02/04/12
BRASÍLIA - Não são raros os exemplos de contradição entre a imagem que o político busca projetar e suas práticas, cedo ou tarde reveladas.
O presidente eleito graças a promessas de moralização e austeridade na verdade se alimentava de um esquema predatório de desvio de dinheiro público. O senador que posava de líder e estrategista do maior partido do Congresso se ocupava de coletar recursos repassados a laranjas e pagar as despesas da amante. O governador que se vendia como gestor moderno contava pessoalmente a grana da propina.
O caso de Demóstenes Torres, porém, é peculiar. Não se trata propriamente de descompasso, mas de um divórcio que beira a patologia.
Em nove anos de mandato, o senador do DEM goiano apresentou-se ao público como a palmatória da República. Em toda entrevista e discurso, fazia questão de apontar os malfeitos do governo federal, quando não alertar para os riscos de "crise institucional". Estava sempre a postos para oferecer aspas indignadas, tão úteis à imprensa.
Agora, grampo após grampo, fica claro que, durante todo esse tempo, o paladino da Justiça não passava de despachante de luxo dos interesses de um contraventor.
A distância entre reputação e realidade é abismal, como se um Demóstenes fosse o negativo do outro. O fenômeno ficou evidente no único e desastroso pronunciamento do senador pós-escândalo, no qual afirmou ser apenas "amigo" de Carlinhos Cachoeira. Em sã consciência, ele deveria ter antevisto que seus inúmeros préstimos ao bicheiro tinham caído nas escutas da PF.
Existe uma máxima segundo a qual os políticos não morrem. Sempre dão jeito de contornar derrotas, denúncias e condenações. Collor, Renan e Arruda estão aí para mostrar.
Mas para Demóstenes não haverá esse "dia seguinte". Desmoralizadas suas duas caras, quem vai querer comprar uma terceira?
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