Na reta final
ROBERTO RODRIGUES
FOLHA DE SP - 10/09/11
Não haverá "anistia a desmatadores", mas os pequenos precisam ter tratamento diferenciado
DOIS ANOS depois da criação da Comissão Especial na Câmara dos Deputados com o objetivo de instituir um novo CÓDIGO FLORESTAL para o Brasil, podemos analisar com olhar crítico o processo de amadurecimento das discussões acerca do tema, sobretudo quanto às previsões e às principais alegações dos que se diziam contrários ao estabelecimento de nova legislação.
Logo depois de criada, a Comissão Especial foi rotulada de "ruralista" e que só atenderia aos interesses do setor produtivo.
Alegavam os mais radicais que seria extinto o instituto da reserva legal e que seria reduzida a proteção de áreas de preservação permanente (APP), que grandes propriedades seriam beneficiadas e que as florestas brasileiras estavam ameaçadas de desmatamento violento.
O processo de discussão se deu de forma intensa e profunda, envolvendo todos os setores da economia e todos os segmentos da sociedade. O Brasil inteiro foi visitado e ouvido pelos integrantes da comissão; o primeiro texto foi aprovado na Comissão Especial em 6 de julho de 2010.
A partir de então, alguns radicais lutaram para que a matéria não fosse a plenário. Os focos de crítica eram basicamente a "anistia a desmatadores", a "liberação de uso das áreas de preservação permanente", a "delegação aos Estados da competência de legislar sobre o ambiente" e a "falta de participação da comunidade científica" nas discussões.
Aprovado no plenário da Câmara em maio de 2011 por 410 votos contra 63, esmagadora e democrática maioria, o texto do senador Luiz Henrique (PMDB-SC), que está agora no Senado, pode, por si só, revelar as verdades e os mitos.
Há o grande desafio de fazer justiça, ou seja, não perdoar aqueles que desmataram ao arrepio da lei existente, mas também não punir aqueles que desmataram quando não havia legislação sobre o tema ou ainda os que o fizeram com incentivo do governo, como no combate à febre amarela, por exemplo.
Para isso, foram mantidos os institutos da reserva legal e a proteção às APPs, já contrariando uma das previsões iniciais.
Foram criados mecanismos de avaliação e de regularização das propriedades, como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), obrigatório a todas as propriedades rurais. Se com ele for identificado um problema, haverá um processo para regularização.
Não haverá "anistia a desmatadores": a reserva legal faltante deverá ser recomposta, regenerada ou compensada.
E as APPs atualmente utilizadas não serão consolidadas a qualquer preço, mas desde que não haja recomendação técnica de recuperação, isto é, com base científica.
Os desavisados ainda poderão dizer que nas propriedades de até quatro módulos haverá, sim, uma anistia.
Pequenas propriedades devem ser sustentáveis, inclusive do ponto de vista econômico. Inviabilizar a vida no campo causa êxodo rural e poluição urbana.
O tratamento diferenciado aos pequenos é imprescindível para que eles tenham as mesmas condições de renda das grandes propriedades.
Finalmente, quanto à delegação de poderes aos Estados, tida como temerária pela possível influência a que estariam sujeitos os governos estaduais, não há nem a liberdade alegada nem a possibilidade da tal influência.
As normas gerais, que servirão de base às legislações estaduais, serão feitas pela União. Não há liberdade total à norma estadual, mas busca-se evitar a temida anistia.
Os Estados brasileiros têm, por força da Constituição Federal, o direito de criar regras para melhor gerir suas características peculiares.
Assim, nenhuma das profecias negativas acerca do código se concretizou.
Resta-nos, como brasileiros, participar do processo de aprimoramento dessa lei tão importante que irá influenciar na vida de cada um de nós.
O novo pensamento, de não mais tratar a questão como exclusivamente ambiental, mas sim como "socioambiental", cada vez mais justifica a obrigação do exercício da competência concorrente e supletiva pelos Estados e a participação de cada cidadão.
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