sábado, setembro 10, 2011

REGINALDO LEME - Monza e Milão



Monza e Milão
REGINALDO LEME
O Estado de S.Paulo - 10/09/11


Depois de Spa-Francorchamps, nada como Monza para sentir na pele a força da tradição da Fórmula-1. Pisar cada palmo deste autódromo preenche aquele sentimento que nos levou a gostar tanto do esporte a motor. Por coincidência, hoje é o dia para me lembrar da primeira vez que pisei aqui para ver Emerson Fittipaldi conquistar o primeiro título mundial de um brasileiro na Fórmula 1. Esta histórica data foi bastante comentada esta semana por conta do programa Linha de Chegada que o SporTV apresentou na terça-feira com as quatro gerações da família Fittipaldi - o velho Barão, de quem eu estava ao lado aqui em Monza naquele 10 de setembro de 1972, os filhos Wilsinho e Emerson, o neto Christian e o bisneto Pietro Fittipaldi, que, aos 15 anos, já vem fazendo sucesso nas pistas norte-americanas.

Monza representa muito. O circuito foi criado em 1922, e está recebendo o GP da Itália pela 61.ª vez. Em nenhuma outra pista da F-1 o piloto anda com aceleração plena durante mais de 80% do tempo em cada volta. A velocidade em treino este ano deve passar dos 350 km/h graças à abertura da asa traseira, permitida em 74% da extensão do circuito. Na corrida, a abertura da asa é mais limitada, mas, ainda assim, será permitida em dois trechos de reta que vão proporcionar um grande número de ultrapassagens. A velocidade é sempre alta porque os carros usam o mínimo de pressão aerodinâmica (15% menos do que em Spa).

No paddock de Monza, o filme documentário de Senna continua sendo assunto. Desta vez foi Eddie Jordan quem veio me contar que ele fez a dublagem em cima dos meus depoimentos. Quando eu fui convidado para gravar os depoimentos, cheguei a pensar em fazê-los em inglês, mas acabei decidindo pelo português para ficar mais à vontade com os fatos a serem lembrados e com o que eu tinha a dizer. Decisão acertada.

Ontem todos os jornalistas brasileiros foram convidados para almoçar com Bruno Senna no motor-home da Renault. Sinto que a equipe, sem um líder desde a ausência de Kubica, está gostando da forma como ele vem conquistando o pessoal técnico em torno dele. E o engenheiro destacado para trabalhar com Bruno é Simon Rennie, o mesmo que trabalhava com Kubica.

Pela 61.ª vez na F-1 moderna, Monza está em efervescência. Na verdade, toda a história da F-1 cabe aqui. Mas não basta ser Monza, tem que ser Milão. Capital da moda, arquitetura, culinária, literatura e do desenho, centro cultural e financeiro da Itália, Milão é uma das cidades que tem mais livrarias, academias, universidades, museus e igrejas do mundo. É também sede de dois dos maiores clubes do futebol mundial (Milan e Inter) e nesta semana, graças a Monza, torna-se capital da velocidade.

Esta coluna foi escrita meio a meio entre Monza e um dos meus lugares favoritos de Milão, o jardim do restaurante Bagutta, que eu conheci nos anos 90 pelas mãos do amigo Gilberto Leiffert. O Bagutta é uma típica tratoria milanesa fundada em 1924 e ponto de encontro de artistas, especialmente escritores. Por isso ali foi criado, em 1927, o prêmio Bagutta de literatura, elegendo o melhor livro italiano de cada ano.

Comandado ainda hoje pela terceira geração da família Pepori, que o fundou, o Bagutta tem em suas paredes os traços de vários pintores e caricaturistas, e uma das atrações, sem dúvida, é o seu garçom mais antigo, o Piero (27 anos de casa), que nos últimos dez anos se tornou um grande amigo. Piero, aliás, é amigo do mundo. Fanático por futebol, ele é capaz de receber as pessoas com o mesmo entusiasmo com que recebeu Ronaldo, Ronaldinho, Kaká, e ainda com prazer de ajudar a quem precisa.

Foi assim que, nove anos atrás, ele acolheu um rapaz que se apresentou no restaurante vindo da Guatemala para pedir emprego. Piero arrumou o emprego, ensinou tudo a Anibal, que hoje é garçom como ele. O Piero é uma pessoa a se conhecer. Mesmo sempre com uma tirada engraçada, ele é uma lição de vida.

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