Saída para aposentados endividados
JURANDIR SELL MACEDO e MARTIN CASALS IGLESIAS
O GLOBO - 16/09/11
Grande parte dos idosos brasileiros da classe média não acumulou um bom patrimônio durante a vida e passa por apertos financeiros na aposentadoria. Os gastos com medicamentos, plano de saúde e exames aumentam nesse período. A renda, no entanto, tende a diminuir. Para muitos, resta apenas a casa em que moram e a dura realidade de ter que vender este bem para continuar se sustentando.
Essa situação poderia ter solução se no Brasil tivéssemos um bom sistema de hipoteca reversa. Através dela, o idoso vende a casa, mas pode continuar morando no imóvel e ainda recebe uma renda mensal. Pode parecer um sonho, mas é algo bem possível. A hipoteca reversa, ou reverse mortgage, faz sucesso nos Estados Unidos e na Austrália e deveria ser implantada no Brasil.
No Estados Unidos, o acesso a esse tipo de hipoteca é permitido a pessoas com mais de 62 anos. A casa em questão deve ser a principal moradia do interessado e dívidas de financiamentos anteriores devem estar quitadas. Com a hipoteca reversa, a pessoa pode trocar o valor da casa por uma renda mensal. É uma forma de complementar a aposentadoria. O idoso abre mão de deixar uma herança aos descendentes, mas evita depender dos filhos e netos ainda em vida. O banco recebe o retorno sobre o investimento quando a pessoa morre ou precisa abandonar a casa. Nesse caso, a casa é transferida ao banco, que vende o imóvel para recuperar seus investimentos.
Ao contrário dos financiamentos normais, na hipoteca reversa é como se o banco fosse comprando o imóvel lentamente, com pagamentos de uma renda mensal. Se a renda for paga por um prazo fixo, ela é direcionada aos herdeiros em caso de morte do morador e o imóvel passa a ser do banco na data estipulada. Já se o idoso optar por receber a renda enquanto viver, ela se extingue no momento em que a pessoa morre, ocasião em que o banco receberá o pagamento. Enquanto vive no imóvel, o antigo proprietário é obrigado a pagar os impostos e o seguro residencial.
Mesmo parecendo complicado, o negócio é bastante simples para todos os envolvidos. O proprietário está vendendo a casa e comprando o direito de morar nela por um tempo ou por toda a vida. No caso de escolher morar até o fim da vida, o banco vai trabalhar com uma previsão de quanto tempo ele vai viver, com base nas tábuas atuariais. Se viver menos, o banco ganha. Se viver mais, o banco perde. A diferença entre o preço de venda e o custo dos aluguéis futuros é direcionada para a compra de uma renda mensal vitalícia - o que já é comum nos planos PGBL ou VGBL no Brasil.
A hipoteca reversa constitui mecanismo natural de alavancar o consumo dos idosos. Muitas pessoas em idade avançada detêm grande parte de sua riqueza financeira na forma do imóvel em que moram. Dadas as características atuais do mercado imobiliário brasileiro, esse patrimônio acumulado é ilíquido caso se faça a opção por continuar a residir nele.
Mas para que esta modalidade de negócio entre em operação no país é essencial que seja definido o marco legal. Em primeiro lugar, a ausência de características regulatórias bem definidas levará a disputas judiciais que tornarão a atividade extremamente onerosa. Em segundo lugar, o marco legal terá que definir as especificidades dos títulos de dívida que financiarão o mercado de hipoteca reversa. Junto a isso, faz-se necessário o surgimento de mercado de seguros específico para hipoteca reversa capaz de abarcar os riscos inerentes a esse produto.
Com a hipoteca reversa é possível transformar o ativo imobiliário em renda para os idosos e resolver um grave e silencioso problema social. Para que esse instrumento útil e moderno tenha sucesso no Brasil é fundamental que haja um esforço coordenado entre o poder público e os órgãos reguladores do mercado de capitais brasileiro.
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