Corrida do ouro
MÍRIAM LEITÃO
O GLOBO - 24/08/11
O preço do ouro caiu ontem. O mercado está otimista, esperando que na reunião de Jackson Hole o Fed tire algum coelho da cartola. Mas ontem foi só um dia. Desde agosto de 2009, o ouro dobrou de valor.
A demanda mundial no segundo trimestre foi a segunda maior da História. No último dia de negócios antes da quebra do Lehman Brothers, em 2008, o ouro valia US$ 750 a onça; agora, vale US$ 1 830: alta de 144%.
O economista José Roberto Mendonça de Barros acha que há sim sinais de que se formou uma bolha no mercado de ouro, diante das inúmeras incertezas atuais da economia internacional.
Como sempre, o ouro é o refúgio em épocas de crise, mas ele acha que em algum momento de maior otimismo na economia a alta de agora será devolvida.
"O medo subiu bastante, mas ao mesmo tempo a volatilidade acompanhará as cotações desse e de outros ativos. Bastou uma esperança de que algo seja anunciado na sexta-feira para ele cair.
Neste sentido, é uma bolha, porque ele subiu no vazio de opções e num momento de incerteza. É exclusivamente fruto do medo. Mas alguém vai morrer com este ouro, porque a alta não se sustenta. Está havendo aumento de produção e quando houver menos incerteza, o mercado devolve 200 dólares num dia."
A espera da sexta-feira é curiosa. Em momentos como esse em que não se sabe muita coisa - se a economia americana terá ou não recessão, se o euro sobreviverá a atual crise, se algum grande banco vai quebrar na Europa, se os países conseguirão pagar suas dívidas - os ativos sobem ou descem de acordo com alguma esperança ou temor que se forme diante de uma data. Agora, espera-se a reunião de Jackson Hole.
Esse lugar ermo, no meio do nada em Wyoming, hospeda anualmente uma tradicional reunião do Fed. Nesse seminário de política monetária em que vão dirigentes dos bancos centrais regionais e a diretoria do Fed, o presidente Ben Bernanke fará um pronunciamento. A expectativa é que ele possa anunciar alguma medida salvadora.
José Roberto acha que talvez ele anuncie algum tipo de coordenação macroeconômica entre as grandes economias. Mas o que alguns bancos e analistas têm esperado é que seja anunciado duas letras e um número mágico: QE3. A terceira rodada de recompra de títulos pelo Fed, que entornará mais dólares no mercado.
Com isso, a economia americana teria mais chances de escapar da recessão. Então a coisa se passa assim: bolsas sobem e ouro cai na expectativa da tal boa notícia; e as tendências se invertem se o fato que preveem não acontecer.
José Roberto acha que uma boa comparação que se pode fazer é com a disparada do dólar paralelo no Brasil no final dos anos 1980. Ele disparou e depois despencou. Em algum momento, pareceu refúgio, depois, o preço voltou a cair.
Na primeira crise do petróleo, nos anos 1970, o ouro também subiu fortemente, para depois cair. Agora, em dois anos, o ouro dobrou. Valia US$ 913 no dia primeiro de agosto de 2009 e agora oscila em torno de US$ 1.830.
Segundo relatório do World Gold Council, os países que mais contribuíram para esse segundo recorde na compra de ouro por trimestre, de abril a junho, foram Índia e China. Isso, incluindo compras pessoais: 55% do consumo mundial de jóias de ouro vieram dos dois países.
Ao todo, no mundo, foram comprados durante o trimestre 919,8 toneladas de ouro, num valor de US$ 44,5 bilhões. Os bancos centrais também compram e os investidores procuram como reserva de valor, num mundo que está ficando cada vez mais sem porta de saída.
"Nos Estados Unidos eu acho que há menos risco de uma crise financeira, mas as autoridades parecem não ter a mais pálida ideia do que fazer; na Europa é o contrário, eles sabem que há um caminho, mas ele é longo e cheio de riscos. A Europa deve manter o euro e fazer um processo de renegociação, como o Plano Brady. Não é um caminho sem riscos. Um deles é político, porque fortalecerá ainda mais a Alemanha e a solução passará por decisões que vão reduzir drasticamente o padrão de vida das pessoas nos países pequenos da região", disse Mendonça de Barros.
Há uma corrida para o ouro, mas como explica Mendonça de Barros, a volatilidade continuará. O preço pode cair tanto quanto disparou. É apenas um dos vários termômetros de como a economia está estranha nos tempos atuais.
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