quarta-feira, agosto 24, 2011

EDITORIAL - FOLHA DE SÃO PAULO - Limites às despesas

Limites às despesas
EDITORIAL
FOLHA DE SP - 24/08/11
Embora ministro da Fazenda reafirme compromisso com austeridade no ano que vem, uma série de gastos novos vai desafiar a meta do governo

Em mais um episódio que atesta a falta de sintonia na política econômica, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, desmentiu rumores de que o governo relaxará os seus gastos no ano que vem.
Na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, o ministro afirmou que os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento não serão abatidos da meta de poupança do governo, o chamado superavit fiscal, em 2012. O titular da Fazenda defendeu ainda mudança de ênfase na política econômica: limitar o gasto público para que o Banco Central possa cortar mais os juros.
Essa diretriz, correta, vem sendo repetida à exaustão neste espaço. Cabe perguntar, contudo, se a intenção de manter um mínimo de austeridade terá condições de se efetivar no ano que vem. Há muitas dúvidas a esse respeito.
Sem contar o crescimento inercial do custeio do governo e despesas novas de menor monta, o Planalto terá de suprir uma demanda extra de gastos em 2012 de R$ 47 bilhões -a título de comparação, a média mensal da despesa federal neste ano tem se aproximado de R$ 60 bilhões. O reajuste de 14% no salário mínimo vai exigir dispêndio novo na Previdência de R$ 23 bilhões. O pacote de redução de impostos de alguns setores industriais, chamado de "Brasil Maior", vai abater R$ 24 bilhões da arrecadação de tributos.
Além disso, há armadilhas fiscais que poderiam ser ativadas como vingança de uma parcela insatisfeita da base governista. Um dos alvos seria o mecanismo constitucional que faculta ao governo reter um pedaço das chamadas despesas carimbadas. Projetos de aumento salarial do funcionalismo, com destaque para o do Judiciário, também frequentam as listas de possíveis retaliações.
O governo provavelmente cumprirá a meta de superavit fiscal de 3% do PIB neste ano. A contenção de despesas na boca do caixa tem ajudado, mas o fator decisivo para esse resultado será, mais uma vez, o crescimento dos impostos.
As despesas federais passaram de 15% para 18% do PIB de 2003 a 2010, alta concentrada na área social (educação, saúde, seguro-desemprego e Previdência). Passa da hora de projetar, ao longo desta nova década, uma trajetória mais compatível com os limites da arrecadação, cuja carga excessiva sufoca a capacidade do Brasil de competir para melhorar a produtividade e os salários. É preciso também dar fôlego para outras prioridades, como a ampliação do investimento em infraestrutura.
É louvável que o ministro Guido Mantega queira mudar a ênfase da política econômica. Para tanto, medidas paliativas, como cortes pontuais e emergenciais do Orçamento, têm escassa serventia.

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