O euro sob risco Celso Ming O Estado de S.Paulo - 24/11/2010 Aumentam as pressões dos políticos e de financistas para que a Irlanda opte por uma "solução argentina" para sua dívida. Se o caminho for esse, haverá calote. E, se houver calote, não se restringirá a esse país. Ontem, a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, quase sempre tão cautelosa, foi surpreendentemente dramática. Depois que o ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, fez graves advertências sobre os riscos à solta com os problemas da Irlanda, Merkel avisou que "o euro passa por uma crise excepcionalmente séria". E pediu que os credores privados se envolvessem diretamente num pacote de resgate. "Nossa moeda comum está sob risco", concluiu. Em sua edição de ontem, o Guardian, de Londres, advertiu que a Irlanda deveria rejeitar as receitas do Banco Central Europeu (BCE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), impor uma solução do tipo argentino e pular fora do euro. O New York Times avisou que começa a ser aventada a moratória da dívida como melhor opção. O caminho argentino foi a imposição em 2002 de um calote unilateral de quase 80% aos credores. O governo Kirchner avisou: "É pegar ou largar." A maioria recolheu os cacos que lhe cabiam e voltou as costas para a dívida argentina. Até hoje, o país está praticamente alijado do mercado de títulos. Outra ideia, menos radical, é a renegociação da dívida, aquilo que os ingleses chamam de corte de cabelo ("haircutting"). Foi a saída brasileira nos anos 80 que só desembocou numa solução final em meados da década de 90. A negociação de uma certa perda para os credores foi também o que a chanceler da Alemanha pareceu sugerir quando pediu o envolvimento dos investidores privados. Seja qual for sua natureza, um calote traria duras consequências. Antes de mais nada, firmaria uma espécie de jurisprudência. A partir desse precedente, todos os integrantes do imenso cordão de endividados, da Europa e de alhures, entenderiam que essa é uma saída disponível. E, nessas condições, se saberia que títulos soberanos não passariam mais a mesma segurança. Fica difícil prever como o mercado financeiro lidaria com essa falta de chão. Se os credores terão de pagar boa parte do ajuste, mais uma safra de perdas será empurrada para os bancos europeus que hoje não gozam de boa saúde. E, se novos naufrágios de instituições financeiras ficarem inevitáveis, a crise poderá ter outros desdobramentos. Ainda em relação a prováveis perdas impostas a credores de dívidas soberanas, não dá para desprezar o impacto sobre o patrimônio de fundos de pensão e das reservas das seguradoras. E há, também, a precária situação do euro. As advertências de que a falta de consistência fiscal e política conspira contra a solidez da moeda comum vão caindo no vazio. Até agora, não foi dado nenhum passo firme para resolver essa debilidade. E é, também, o que leva tantos consultores a sugerir que a Irlanda e outros países encalacrados em dívidas abandonem de uma vez o euro. Quando impôs perda patrimonial a seus credores, a Argentina ao menos pode desvalorizar sua moeda e, dessa maneira, aumentar a renda dos exportadores. Por não ter moeda nacional, nem a Irlanda nem os demais membros da área do euro podem recorrer a esse expediente. |
quarta-feira, novembro 24, 2010
CELSO MING
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