sexta-feira, novembro 20, 2009

MÍRIAM LEITÃO

Ciência e tempo

O GLOBO - 20/11/09


O ministro inglês do Meio Ambiente, Hilary Benn, está convencido de que a reunião de Copenhague será bem-sucedida. “A ciência é clara, e o tempo é curto.” Benn passou esta semana no Brasil e fez elogios ao país e ao presidente Lula, que mostrou “liderança” ao anunciar compromissos de corte de gases de efeito estufa. Ele disse que haverá financiamento dos países ricos

Ele me disse que não entendeu o comunicado da Apec, Cooperação Econômica Ásia e Pacífico, como um sinal de que China e Estados Unidos querem adiar o acordo do clima: — Não creio que eles queiram adiar. Eles discutiram até que ponto é possível se resolver as questões em Copenhague para se chegar a um acordo legalmente obrigatório. O que está claro é que precisamos de um acordo forte, e o que foi discutido na Apec não muda isso, porque a ciência é clara, e o tempo é curto.

Entrevistei o ministro num programa que foi ontem ao ar na Globonews e repete hoje às 8h30m e 16h30m. Ele disse que na reunião de cúpula do clima os países precisarão dizer claramente que compromissos estão dispostos a aceitar.

Explicou que a Europa já disse que vai chegar a 2020 emitindo 20% menos do que em 1990. A Inglaterra foi além, propôs 34% e promete chegar a 2050 emitindo 80% menos do que em 1990: — É essencial termos a contribuição dos Estados Unidos. As pessoas precisam colocar os números na mesa. Para fazer um tratado válido, um país vai olhar para o outro e dizer: “o que você vai dar? O que vai oferecer?” Quando somarmos todas as ofertas feitas, poderemos ver se é o bastante para evitar uma perigosa mudança climática.

Não faz sentido que os líderes digam assim: “vou prometer ao meu povo que faremos isso, mas estou relutante em assinar um acordo internacional.” Hilary Benn vem acompanhando essa negociação há algum tempo como parlamentar ligado à causa ambiental, antes de ser ministro, e por isso tem uma visão concreta de quanto se avançou.

Lembrou que nos EUA, anos atrás, o governo até negava a existência da mudança climática e hoje está disposto a negociar. Entre os avanços dos últimos anos, ele inclui o Brasil: — O Brasil mostrou um grande progresso. O índice de desmatamento hoje é um quarto do que era há cinco anos. Foi muito bem recebido o comunicado do presidente Lula em nome do Brasil, semana passada, porque mostra liderança de verdade, que é o que queremos em Copenhague.

Lembrei a ele que o desmatamento caiu, mas 7.000 km2 é uma área equivalente a 4.4 vezes o tamanho da área metropolitana de Londres: — É uma área imensa, mas se há 10 anos alguém dissesse que seria possível reduzir a um quarto a área desmatada em cinco anos, ninguém acreditaria. É muito importante na nossa missão reconhecer quanto é feito de progresso. Ainda falta muito? Falta. Já demonstramos que temos capacidade de fazer as mudanças necessárias? Acho que sim.

Acha que hoje há progressos em proteção de florestas, em uso de energia, em posição política, em compreensão científica, em decisão de agir dos governos.

O governo inglês — ressaltou — foi o primeiro a ter uma lei climática, a ter um orçamento de carbono para a própria administração pública. Funciona assim: cada órgão do governo tem que cumprir uma meta de redução das emissões em suas atividades.

O ministro admite que se uma parte do acordo de Copenhague será o esforço de cada país, a segunda parte envolverá financiamento para que países em desenvolvimento possam fazer sua transição: — As economias emergentes e em desenvolvimento perguntam, e com razão: como pagaremos pela baixa emissão de carbono, pelas novas tecnologias e mudanças necessárias? Sem dúvida, isso tem que fazer parte do acordo. Na última cúpula, o primeiroministro Gordon Brown disse que até 2020 o apoio financeiro tem que ser de US$ 100 bilhões por ano e viria de fontes públicas e de fontes privadas através do mercado de carbono.

Ele acha que não faz sentido que os grandes emergentes, que são também grande emissores de gases estufa, não tenham que cumprir meta, e que países como China, Brasil e Índia sejam tratados da mesma forma que os países pobres: — A China e o Mali são países inteiramente diferentes, com um grau de responsabilidade diferente.

Londres vai sediar as Olimpíadas em 2012, e eu perguntei como ele vai assegurar a Olimpíada sustentável.

Ele disse que isso tem que ser pensado desde o começo. Contou, por exemplo, que em vez de usar caminhões para levar material de construção para Vila Olímpica, eles usaram barcos e foram pelo Rio Tâmisa.

E que só isso já reduziu muito o volume das emissões. O segredo de uma Olimpíada verde é pensar desde o início do projeto.

Antes de começar a entrevista, eu disse que o número dos céticos, os que não acreditam em mudança climática, está diminuindo a tal ponto que eles já são uma espécie em extinção.

Ele deu uma boa gargalhada e admitiu: — Eu me preocupo em proteger as espécies, mas sobre essa, em particular, acho que não devo me preocupar.

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