FOLHA DE SP - 01/09
Michel Temer, agora presidente efetivo, é uma caixa-preta. Pouco, quase nada, se sabe sobre qual é o seu projeto de país.
Não se sabe por vários motivos. Primeiro, o PMDB, seu partido, não apresenta candidato presidencial desde que Orestes Quércia foi estraçalhado nas urnas em 1994.
Logo, o partido (e Temer, por extensão) não precisou nesses 22 anos transcorridos desde então apresentar um programa de governo. Nem mesmo aqueles programas de fantasia que são elaborados e divulgados a cada eleição, para serem esquecidos ou descumpridos depois da vitória.
Em segundo lugar, Temer sempre foi um político discreto, para não dizer medíocre. Se fosse mais relevante, teria sido lembrado, em algum momento de sua longa vida pública, para a cabeça de chapa em eleição presidencial ou, pelo menos, na estadual de São Paulo, sua base.
Ao ser discreto, o hoje presidente nunca foi solicitado a apresentar seus pontos de vista sobre os grandes problemas nacionais. Conhecem-se dele, é verdade, alguns trabalhos sobre temas jurídicos, mas, de um presidente da República, espera-se muito mais do que isso.
Temer nem poderia ser explícito sobre o conjunto de questões que inquietam o país porque o PMDB não é um partido e, sim, uma confederação de caciques regionais, um "partido ônibus", como dizia Fernando Henrique Cardoso, que se divide até em votações como a do impeachment/inabilitação de Dilma.
Completa o cenário o fato de que, na sua interinidade, Temer não chegou a apresentar uma plataforma mínima. A única prioridade anunciada –o saneamento das contas públicas– não é uma agenda própria mas imposição da realidade.
Mesmo que Dilma Rousseff tivesse sido mantida na Presidência, teria forçosamente que enfrentar essa questão tal a deterioração ocorrida nos últimos anos nesse quesito essencial. Tanto que ela ameaçou fazê-lo ao assumir o segundo mandato, mas foi tão hesitante e tão canhestra que acabou fracassando.
Do meu ponto de vista, mais que a questão fiscal o que definirá o sucesso ou o fracasso de Temer será sair ou não da recessão.
Feita essa ressalva, cabe perguntar se o impeachment por si só conseguirá resolver o imbróglio em que o país está metido.
Responde, em artigo para a "Forbes", João Augusto de Castro Neves, diretor para a América Latina do Eurasia Group:
"Contra o pano de fundo de uma economia global menos favorável, uma combinação de profunda recessão, desequilíbrio fiscal, escândalo de corrupção em andamento e a habitual contenda política, constitui o que muitos têm chamado de tempestade perfeita. Embora o fim de um longo processo de impeachment traga algum respiro, o novo governo continuará a enfrentar um batalha morro acima para pôr o país nos trilhos de novo".
Batalha que se dará em terreno pantanoso: um mundo político apodrecido, no qual Michel Temer se moveu sem maiores constrangimentos. Resta saber se, agora que é obrigado a abrir a sua própria caixa-preta, o novo presidente tem um projeto de país capaz de subir o morro.
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